31/10/2013

[Atividade 8º Ano - Maquete - Quilombos e Comunidades Quilombolas]



A presença dos povos africanos no Brasil data dos momentos iniciais da história do país. Os primeiros africanos chegaram entre 1550 e 1551 (séculos XVI e o XVII), durante o governo de Tomé de Sousa e se concentraram principalmente na região nordeste no território.
Os escravos eram trazidos principalmente ao Nordeste para a atividade açucareira, sobretudo para fazendas na Bahia e em Pernambuco. Em menos número eram enviados ao Pará, Maranhão e Rio de Janeiro. No final do século XVII, a descoberta do ouro na província de Minas Gerais eleva o volume do tráfico, que passa a levar os cativos para a região das minas. No século XVIII, o ouro sucede o açúcar na demanda de escravos, o café substitui o ouro e o açúcar no século XIX.
O mapa nos mostra a rota do tráfico dos negros para as Américas.
Provenientes de diferentes regiões africanas, os escravos eram trazidos pelos portugueses, sendo transportados em suas caravelas vindas da África. Os holandeses também realizavam o tráfico de escravos para o Brasil. O número de escravos embarcados dependia da capacidade da embarcação. Nas caravelas, os portugueses transportavam até 500 cativos. Um pequeno navio podia transportar até 200 escravos, um navio grande até 700.
A bordo, todos os escravos eram marcados a ferro no ombro ou na coxa. Embarcados, os cativos são acorrentados até que se perca de vista a costa da África. Os navios negreiros embarcavam mais homens do que mulheres. O número de crianças era inferior, de 3% a 6% dos embarcados.
Assim que chegavam ao Brasil os escravos eram vendidos para grandes proprietários de terras. Tinham de trabalhar, principalmente, nas plantações de cana-de-açúcar e no processo de produção do açúcar.
Escravo: é todo aquele que está sujeito a um senhor e é tido como sua propriedade. Assim, um escravo não tem liberdade para fazer o que quer, pois deve obediência a seu senhor. Normalmente, um escravo não conta com qualquer forma de proteção, pode ser vendido, trocado ou doador por seu proprietário. Pode ser severamente punido por meio de castigos físicos (como a flagelação) ou mesmo pela pena de morte.

A mão de obra escrava também era empregada em trabalhos necessários à vida cotidiana, tais como o cultivo de roças, a criação de animais, o serviço doméstico, etc.

Entre o final do século XVII e o início do século XVIII, o trabalho dos escravos africanos foi também muito utilizado na mineração do ouro e dos diamantes. Durante boa parte do século XIX, muitos escravos trabalharam nos cafezais das regiões do Vale do Paraíba e do Oeste Paulista.

Embora alguns fugitivos conseguissem escapar, mudando de nome e passando a viver de ganhos eventuais no campo e nas cidades, e outros, raros, se engajassem em navios mercantes e regressassem à África, a maior parte dos que jamais foram recapturados encontrava alternativa distinta. Do rio da Prata ao sul dos EUA, os palenques, quilombos, cumbes, marrons e mainels se constituíam e reconstituíam à margem das plantations, minas e cidades. 


Só em Nueva Granada, entre os rios Cauca e Magdalena e ao redor de Cartagena, foram identificados mais de meia centena de palenques entre os séculos XVI e XVIII, dos quais os de San Basílio, La Ramada, Santa Cruz de Mazinga, Betancur, Uré, Matuderé e San Jacinto são os mais famosos . Em Minas Gerais (Brasil), havia pelo menos 166 quilombos entre 1711 e 1795 (Amantino, 2003). Ainda hoje há descendentes de cimarrones vivendo em enclaves no Caribe, América Central e América do Sul.Costumavam refugiar-se em bosques e regiões pantanosas, então abundantes nas Américas. E faziam-no não apenas em busca da necessária proteção contra os caçadores de escravos e milícias coloniais, mas também por causa da infinidade de recursos que semelhantes meios ofereciam, representados pela possibilidade de caçar e pescar e de obter lenha e cipós. De fato, segurança e abastecimento eram requisitos iniciais imprescindíveis para a sobrevivência de pequenos assentamentos que, com alguma sorte, podiam transformar-se em núcleos estáveis de camponeses autônomos.


Na linguagem africana Iorubá, “quilombo” significa “habitação”. Foi no Brasil que o termo ganhou o sentido que tem atualmente.
Um dos quilombos mais famosos foi o Quilombo dos Palmares, que ficava na então capitania de Pernambuco, atualmente o estado brasileiro de Alagoas. Esse quilombo recebeu esse nome pois um escravo chamado Zumbi foi o grande líder da aldeia.Denominam-se "quilombolas" os habitantes dos quilombos. Atualmente, as comunidades quilombolas passam por um processo de reconhecimento legal de sua existência por parte dos governos nacionais e das organizações internacionais.

Contato do Negro com o Índio 


Mais no Brasil do que em qualquer outra parte, em muitas ocasiões, os indígenas serviam às autoridades como forças repressoras de quilombolas, como no caso dos tapuias que ajudaram os portugueses a destruir o quilombo de Palmares em fins do século XVII. Por sua vez, uma carta de Sancho de Alquiza ao rei, de fevereiro de 1612, afirmava que os caribes possuíam dois mil escravos africanos nas ilhas que habitavam nas Antilhas . Há evidências de que, também no sul dos EUA, os aborígines mantinham negros fugidos como escravos ou com eles estabeleciam uma espécie de arranjo feudal no qual os negros residiam em seus próprios assentamentos (as "aldeias negras" de que falam as fontes inglesas) e davam tributos anuais e serviços aos seus "senhores" nativos. Em contrapartida, há inúmeros episódios de negros escravizados e livres que contribuíam para sufocar indígenas inassimiláveis, além dos casos em que autoridades metropolitanas utilizavam-se abertamente dos quilombos para seus próprios objetivos, como no Panamá de 1570, onde os ingleses conseguiram a aliança dos cimarrones contra os espanhóis.

Mestiçagem

A mestiçagem era igualmente comum na capitania do Mato Grosso (Brasil), onde, em 1770, o quilombo do Piolho fora destruído pela primeira vez. Embora nessa ocasião tenham sido capturados 79 negros e 30 aborígines, os negros que escaparam logo voltaram ao assentamento original e constituíram famílias com mulheres indígenas. Vinte e cinco anos depois, durante uma nova batida das autoridades, foram capturados seis negros idosos, os patriarcas da comunidade, oito índios, 19 índias e 21 caburés (filhos de índios com negros) com idades de dois a 16 anos . O elevado número de mulheres, quando comparado aos oito índios, sugere a preferência pela permanência de mulheres indígenas no quilombo, prática que remetia a um crônico deficit de mulheres negras e à incorporação das índias como recurso demográfico para a constituição de famílias. A esse respeito, quando Diego de Frías ocupou o assentamento de rio Piñas (Panamá), em 1580, observou que a comunidade possuía algumas mulheres indígenas, capturadas em guerras contra nativos das proximidades.  


Embora os quilombos em princípio representassem ameaça real ou potencial à segurança e à propriedade de muitos, as comunidades locais de livres se relacionavam com eles de modo desigual, em claro questionamento da ideia de que todo quilombo necessariamente constituísse uma espécie de 'contrassociedade' ou foco de inassimilável resistência ao sistema escravista. Do ponto de vista dos responsáveis pela manutenção do status quo, ao apontar para alternativas de vida possíveis, os quilombos eventualmente expunham as fragilidades da própria sociedade colonial. Eis por que, embora a maioria dos quilombos americanos fosse formada tão somente por negros - em geral com predomínio dos nascidos na África, até que o tráfico atlântico fosse abolido - , existiam algumas comunidades plenamente constituídas que, além de índios, acolhiam brancos e mulatos livres pobres. Para não falar nos casos em que colonos e autoridades metropolitanas utilizavam-se abertamente dos quilombos em função de seus próprios objetivos. Assim, se no Panamá de 1570 os ingleses conseguiram a aliança com os cimarrones contra os espanhóis, em Saint Domingue e nas regiões de Chesapeake Bay e da Carolina Lowcountry a fuga associada de escravos negros e servos brancos ingleses e irlandeses era tão antiga quanto a escravidão. No Brasil de 1769, uma expedição de combate a um quilombo redundou na prisão de oitenta pessoas de procedências diversas, algumas das quais, mesmo sem serem quilombolas, haviam-se "estabelecido em terras do mesmo quilombo com famílias, roças, crianças e mulheres", informa uma fonte. Vinte e cinco anos depois, em Minas Gerais detectou-se a existência de mais um grande quilombo "muito antigo, [formado] não só de negros e mulatos fugidos, mas também de alguns brancos", descreve carta do governador Luiz da Cunha Meneses (Meneses, 1785).

Organização

A presença de plantações de algodão sugere a confecção de tecidos e a existência de grupos especializados na realização de algumas atividades. Nos mapas dos quilombos de Minas Gerais pode-se perceber que também as construções expressavam especialização. Alguns mencionam a presença de casas e forjas de ferreiro, aspecto reiterado por achados arqueológicos posteriores. No quilombo da Cabaça foram encontrados dezenas de fragmentos de ferro fundido, chapas de metal e tiras de estanho, além de panelas, caldeirões, chaleiras, colheres e demais utensílios. Alguns desses objetos apre-sentavam reparos feitos com rebite, o que demonstra certo grau de conhecimento dessa técnica pelos quilombolas. O diário de Johann Blaer afirma que, em um dos assentamentos de Palmares, erguia-se uma igreja e quatro forjas, "havendo entre os habitantes toda sorte de artífices".





Defesa

Na capitania brasileira do Rio Grande do Sul da primeira metade do século XIX (1829) localizava-se o quilombo do Barba Negra, com cerca de trinta homens e um número indeterminado de mulheres. Durante a época de maior demanda por mão de obra, de dezembro a fevereiro, eles eram sistematicamente utilizados pelos estancieiros, que lhes pagavam salários. Várias vezes o quilombo escapou da destruição, pois a população local sempre os alertava para as expedições que reiteradamente buscavam liquidá-los. Eis um exemplo de como as redes de interação e sociabilidade dos quilombolas com o entorno por vezes também constituíam sua principal defesa. Outras comunidades, ao contrário, longe de se aliarem aos vizinhos, mostravam-se bem eficientes em atacá-los. Para tanto, contribuía o fato de que, embora os quilombos constantemente mesclassem padrões culturais ameríndios e europeus, parcela expressiva de seus fundadores era africana, e nascer na África e não em outro lugar conferia uma especial dimensão a determinadas práticas, crenças e tipos de organização prevalecentes entre eles.Defender-se representava a obsessão, e não apenas contra caçadores de escravos e milícias coloniais, mas igualmente contra ataques de indígenas e de outros quilombolas. Para tanto, armas mais toscas, mas nem por isso menos eficientes, como arcos, flechas e lanças eram por eles próprios produzidas. Pólvora e chumbo, para armas de fogo - já se disse - eram obtidos mediante trocas com a sociedade colonial ou resultavam de ataques periódicos a fazendas, vilas e andarilhos.Os ataques e raptos que perpetravam abalavam a economia de muitas regiões, sendo abundantes os relatos acerca de ações que arruinavam colonos. No Brasil, em 1746, as autoridades afirmavam que os quilombolas do Campo Grande entravam nas pequenas fazendas e nos povoados, deles retirando "não só os bons escravos e escravas mas [também] matando os senhores [e] cuidando em tirar negros em lotes de 10-12 de cada sítio, os quais com pouca violência os seguem". Em 1770, os ataques a fazendas seguiam "destruindo tudo, pondo em miserável estado, ultimamente levando os escravos e escravas, sem um só deixarem" (Cartas e ofícios..., 1770). Os ataques naturalmente despertavam a fúria dos escravocratas, que logo retrucavam. Em resposta, os quilombolas se defendiam de modos que variavam de acordo com a localização e o tipo de assentamento. Os cimarrones, que em 1603 se defendiam dos espanhóis em Ciénega de Mantua, Nueva España, faziam-no combinando o uso de espadas e arcabuzes e lanças, arcos e flechas. Muitos lançavam mão de armadilhas de origem africana, outros de sistemas de armadilhas próprios da América. No quilombo Buraco do Tatu (1764), na Bahia, os mecanismos de defesa e sua disposição assumiam uma configuração e funcionalidade claramente africanas, com armadilhas cobertas e estacas pontiagudas que eram igualmente usadas para proteção de aldeias desde a atual Nigéria até o antigo reino do Congo, e que também foram encontradas em Palmares e em outros palenques das Américas (Schwartz, 1987, p.74). Em grande número de quilombos havia uma área claramente estabelecida para a localização dos sistemas de segurança, entre o núcleo dos assentamentos e as matas. Em geral, em tal área se encontravam fortalezas, estrepes e fossos, como no caso do assentamento de Yanga que, segundo relatos do padre Juan Laurencio, resistiu aos ataques ordenados pelo vice-rei Luís de Velasco com defesas constituídas por espessos muros de pedra, terrenos plenos de armadilhas em vime, além de matreiras pontes. Os cimarrones tentavam deter os espanhóis utilizando ainda foices, flechas com pontas de metal e pedra .

Mesmo quilombos que não apresentavam semelhantes armadilhas estavam construídos de modo a obter proteção. Na América portuguesa, o quilombo da Tábua, destruído em 1769, possuía duzentas casas cobertas com telhas, metade delas protegidas por uma fortificação (Cartas e ofícios..., 1770). No Quilombo do Campo Grande, em 1746, foram detectados mais de seiscentos negros vivendo com "fortaleza, cautelas e petrechos tais que se entende pretenderem se defender". Seus membros resistiram aos ataques dos colonos por mais de 24 horas, fazendo com que as forças repressoras tivessem de fustigá-los "com fogo e dar terceiro assalto para render uma forma de trincheira a que recolheram depois de destruído o primeiro palenque".

Os quilombolas contavam ainda com as próprias características do terreno para a sua segurança. Dados arqueológicos referentes ao Sudeste brasileiro mostram que no sítio onde existira o quilombo do Ambrózio havia restos de um fosso de proteção cujas dimensões variavam entre 1,5 e 2m de largura por 2m e 3m de profundidade, circundando uma área de cerca de 90m de comprimento por 70m de largura. Ao norte, além do fosso, os quilombolas contavam com a proteção de um brejo; a oeste, situava-se o morro do Espia, ponto mais alto da região, usado como ponto de observação. Em regiões pantanosas, as constantes inundações formavam brejos que, dificultando o acesso, apenas tornavam-se acessíveis por meio de pequenas embarcações, o que por si só já dificultava o deslocamento de grandes grupos de atacantes. Não raro, após ultrapassá-los devia-se caminhar por extensos campos abertos, o que aumentava as chances de os invasores acabarem descobertos.



Comunidades Quilombolas



Atualmente




Material referência Maquetes:

São Paulo

 

O município de Sorocaba, localizado no centro-sul de São Paulo, atualmente é um dos maiores do Estado, apresentando um importante pólo industrial e minerador. Mas são nas cidades que lhe fazem fronteiras que nossa atenção se volta neste link.
Em Salto de Pirapora, Pilar do Sul, São Roque e Votorantim há atualmente cerca de seis comunidades remanescentes de quilombo.

O povoamento da região sorocabana se deu por meio de movimentações de tropeiros que iam para a Região Sul do País ou de lá voltavam. Sorocaba era um importante ponto de parada e encontro entre tropeiros, principalmente na época das grandes feiras de comércio de muares e reses.

Não foi uma região com grande concentração de mão-de-obra escrava, como outras no estado. Especializou-se no comércio de animais e na pequena agricultura para abastecimento interno. Mas, por ser um entreposto comercial, essa região também negociava escravos, mesmo após a proibição do tráfico, em 1830.

Acredita-se que a maior parte das comunidades quilombolas da região tenha se constituído em terras adquiridas por ex-escravos ou doadas pelos senhores a seus escravos.

Na região são conhecidas seis comunidades: Cafundó, Piraporinha e Fazendinha dos Pretos (no município de Salto de Pirapora), Carmo (em São Roque), Fazendinha Pilar (na cidade de Pilar do Sul) e Os Camargo (em Votorantim).

Destas, apenas a do Cafundó já teve o processo de titulação de suas terras iniciado. Esta também é uma das comunidades de quilombo mais famosas, devido principalmente, ao fato de seus habitantes falarem um dialeto de origem africana.

 CAFUNDÓ
A comunidade remanescente de quilombo do Cafundó é constituída por cerca de 18 famílias e localiza-se no município de Salto de Pirapora, no Estado de São Paulo.

O Cafundó foi "descoberto" pelos meios de comunicação no ano de 1978. Pesquisadores, jornalistas, políticos da região, ativistas de movimentos sociais voltaram seus olhos para a comunidade.

A principal singularidade desta comunidade está no léxico denominado cupópia ou falange, de origem africana, uma espécie de dialeto falado pelos membros da comunidade.

Esta característica cultural despertou grande curiosidade e levou muitos a considerarem a comunidade como uma espécie de reduto do período escravocrata que permaneceu intacto durante décadas.

Equivocam-se os que assim pensam. Longe de estar isolada ou intocada, Cafundó é uma comunidade quilombola que, assim como outras em São Paulo, sofre com as invasões de suas terras e luta para que sejam garantidos seus direitos territoriais.

HISTÓRICO DA COMUNIDADE
Segundo a memória do grupo, as terras do Cafundó foram adquiridas por um casal de
ex-escravos, Joaquim Congo e Ricarda. Eles haviam recebido, em 1888, a doação de um lote de terra de seu antigo dono, José Manoel de Oliveira. Posteriormente, o casal trocou as terras doadas pela área onde hoje se situa a comunidade.

As duas filhas de Ricarda e Joaquim Congo - Antônia e Efigênia -, que permaneceram morando no Cafundó, deram origem aos dois grupos de parentes que hoje habitam a comunidade: os Almeida Caetano e os Pires Cardoso.

Antônia casou-se com Joaquim Pires Cardoso, descendente de escravos, mas nascido livre, e Ifigênia casou-se com Caetano Manoel de Oliveira, que morava numa comunidade vizinha denominada Caxambu, que hoje não existe mais.

As relações entre Cafundó e Caxambu foram bastante intensas, tendo havido vários casamentos entre seus membros.

A partir da década de 1940, os territórios de Cafundó e Caxambu foram alvos da cobiça de fazendeiros vizinhos que compraram lotes, grilaram grande parte das terras ou simplesmente invadiram a área dessas comunidades.

Caxambu perdeu quase a totalidade de suas terras. Cafundó permanece com menos de um quarto do território original e luta para conseguir de volta o que lhe foi tomado.

ATIVIDADES PRODUTIVAS
Os moradores do Cafundó encontram grandes dificuldades para garantir sua sobrevivência devido à usurpação de seu território. O reduzido tamanho de área que ocupam atualmente limita as possibilidades da produção agrícola e de geração de renda.

Por conta disso, quase todos trabalham como empregados fixos ou diaristas em propriedades da região. Empregam-se principalmente como pedreiros, jardineiros, caseiros e cortadores de eucalipto.

As roças são destinadas apenas para o consumo interno. Plantam-se principalmente o feijão, o milho e a mandioca. Criam também animais, como galinhas, porcos e gado.

ORGANIZAÇÃO SOCIAL
As casas da comunidade estão dispostas em forma circular e há dois grupos: de um lado a parentela Pires Cardoso e do outro os Almeida Caetano.

Casas de pau-a-pique com o chão de terra batida e uma capela, situada logo na entrada da comunidade, são as construções mais antigas.

A partir da década de 1980, casas de alvenaria foram construídas com a ajuda financeira de diversas entidades e do poder público local.

A capela é povoada de imagens de santos católicos e do Candomblé, além de fotografias de pessoas falecidas da comunidade.

É em torno dela que, no mês de maio, realiza-se a Festa de Santa Cruz, da qual participam, além dos cafundoenses, pessoas dos arredores e também de localidades mais distantes. Nessa festa é comemorada também a abolição da escravatura.

Atualmente, parte da comunidade é praticante do Catolicismo e de religiões afro-brasileiras (como o Candomblé) e outra parte é evangélica.

"LÍNGUA AFRICANA"
A "língua africana" falada pelos moradores do Cafundó é um dialeto conhecido como falange ou cupópia. Possui um vocabulário limitado constituído por 140 palavras aproximadamente. A maior parte delas tem origem na língua africana chamada quimbundo, da família banto, falada principalmente em Angola.

Conforme explicam os pesquisadores Peter Fry e Carlos Vogt, o uso da língua se dá através de um aportuguesamento, principalmente na estrutura sintática e também do uso de palavras da língua portuguesa no meio das frases. Por exemplo: vimbundo está cupopiando no injó do tata - que quer dizer: "o homem preto está falando na casa do pai".

Ainda segundo os mesmos pesquisadores, outro recurso de que esta língua dispõe é o de criar metáforas e metonímias para expressar algo que não é contemplado no vocabulário original. Como nos casos de:
- tenhora da mucanda - que quer dizer "enxada da escrita" e é utilizada para denominar caneta.
- cambererá do vava - que quer dizer "carne da água" e é utilizada para denominar peixe.
- nangá do viso - que quer dizer "roupa dos olhos" e é utilizada para denominar óculos.
A cupópia ou falange é falada em situações diversas: quando se quer dizer algo em segredo - na frente de pessoas que desconhecem a língua -, em diálogos cotidianos ou ainda quando é ensinada às crianças da comunidade.

A cupópia é uma importante forma de preservação da identidade cultural da comunidade.



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VALE DO RIBEIRA
Ao longo do Vale do Rio Ribeira do Iguape, no sul do Estado de São Paulo, encontra-se um importante conjunto de comunidades quilombolas. Nesta região, que abriga a maior vegetação remanescente da Mata Atlântica do Brasil, vivem, além dos quilombolas, povos indígenas, caiçaras e pequenos produtores rurais.
Ao menos 30 comunidades descendentes de quilombos estão no Vale do Ribeira, distribuídas principalmente nos municípios de Iporanga, Eldorado, Barra do Turvo, Cananéia, Iguape, Itaoca e Jacupiranga.

A ocupação negra do vale foi feita por ex-escravos fugidos ou libertos, principalmente ao longo do século XVIII. Os escravos fugitivos chegavam à região, se casavam com mulheres locais e se fixavam em terras próximas, tornando-se pequenos agricultores. Tinham muitos filhos, que também se casavam e se espalhavam pelas terras da região.

Sabe-se que os atuais habitantes das diversas comunidades do Vale do Ribeira têm uma descendência familiar comum. Os moradores contam, por exemplo, que um ex-escravo fugido chamado Bernardo Furquim teria chegado à comunidade de São Pedro, se casado com duas mulheres e tido ao menos 24 filhos, que se espalharam pela região. Até hoje, há descendentes dessa família em diversas comunidades do Vale. Pode-se dizer que aconteceu o mesmo com algumas outras famílias originárias da ocupação da região.

"Em todas as comunidades, todo mundo tem um pouquinho de parentes", conta Ivonete Alves da Silva, moradora da comunidade quilombola de Ivaporunduva.

Hoje, as comunidades vivem em situação semelhante: suas atividades econômicas são basicamente as mesmas, enfrentam os mesmos problemas e participam das mesmas lutas. Além disso, convivem nas horas de lazer e confraternização, participando de atividades comuns, tais como o campeonato de futebol entre comunidades quilombolas, por exemplo.

Os quilombolas do Vale do Ribeira foram os primeiros no Estado de São Paulo a se organizar para reivindicar seus direitos territoriais. Já no início da década de 1990, contando com o apoio da Diocese de Registro, da Comissão Pró-Índio de São Paulo e do Fórum Estadual de Entidades Negras de São Paulo, entre outras organizações, começaram a pleitear a titularidade de suas terras.

Como resultado da mobilização dos quilombolas, em março de 1996 o Governo do Estado de São Paulo criou um Grupo de Trabalho, formado por representantes governamentais e não-governamentais, que tinha por objetivo fazer proposições visando à aplicação dos direitos constitucionais dos quilombolas.

As conclusões do Grupo de Trabalho levaram à criação de um programa de cooperação técnica e de ação conjunta para identificação, discriminação e legitimação de terras devolutas do Estado ocupadas por remanescentes de quilombo e de um Grupo Gestor para implementá-lo (Decreto nº 41.774, de 13 de maio de 1997).

Em 2001 ocorreu a primeira titulação de uma terra quilombola no Vale do Ribeira. Foi também a primeira titulação do Estado de São Paulo. Nesta mesma data, o governo do Estado entregou os títulos de propriedade para as comunidades de Maria Rosa, Pilões e São Pedro.
Posteriormente, em 2003, foram tituladas as terras das comunidades de Ivaporunduva e Pedro Cubas.


ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA

SISTEMA PRODUTIVO
As comunidades de quilombo do Vale do Ribeira praticam uma economia que se assenta na mão-de-obra familiar e está orientada prioritariamente para a satisfação das necessidades do grupo doméstico.
Seu sistema produtivo se sustenta basicamente nas atividades agrícolas e extrativistas. No entanto, muitas vezes os quilombolas também realizam trabalho assalariado nas plantações dos grandes proprietários de terras locais ou em centros urbanos, para poderem complementar a renda familiar e adquirir alguns bens e utensílios diversos não produzidos localmente.
"Vivemos em situação muito difícil. Tem pessoas que saem da comunidade e vão fazer serviço para fora. Daqui ainda tem gente que faz isso. Tem duas pessoas que estão lá em São Paulo pintando torres de energia elétrica. Tem muita gente daqui que faz serviço na região de Eldorado, por aí. Eles não vão morar, vão fazer o serviço e voltam", conta Benedito Alves da Silva, morador da comunidade de Ivaporunduva.
Além disso, criam animais de pequeno porte (tais como galinhas, porcos, patos, cabritos e perus), que utilizam como alimento e como eventual fonte de renda, e pescam nos rios e córregos da região.
A extração que realizam é principalmente de palmito, e também de produtos como sapé e taquara (utilizados para cobertura de casas e fabricação de utensílios).
A agricultura é bastante variada. São plantados arroz, milho, feijão, mandioca, cana-de-açúcar, batata-doce, algumas fruteiras (como abacaxi, maracujá, mexerica), hortaliças (couve, cebola, alface, alfavaca, cebolinha, etc.) e alguns produtos vegetais silvestres (tais como o coentro e o gengibre).
Algumas comunidades também cultivam banana para a comercialização. De forma geral, esse cultivo é realizado apenas em pequena escala, já que o transporte do produto para os centros consumidores é bastante difícil. Por enquanto, apenas a comunidade de Ivaporunduva conta com uma infra-estrutura mais desenvolvida para a realização dessa atividade e comercializa a banana em maior escala.
Tradicionalmente a agricultura dessas comunidades era praticada em um regime chamado coivara. Nessa técnica, a roça é aberta antes do período das chuvas em local de mata densa, compreendendo entre um e seis hectares. As vegetações rasteiras e de pequeno porte são derrubadas, empilhadas em locais estratégicos e deixadas por algum tempo para secar. As árvores maiores são derrubadas e as pilhas de vegetação derrubada são queimadas, o que ocorre logo antes de o plantio começar.
Inicialmente é plantado arroz e às vezes também milho. Depois da colheita, o terreno é carpido e o feijão é plantado. Depois o milho é novamente plantado.
Por três anos, essas plantações são intercaladas. Passado esse tempo, o solo já perdeu sua fertilidade inicial e a roça é abandonada. As terras permanecem em descanso por períodos que variam entre 3 e 12 anos, até que os nutrientes do solo se reconstituam tornando-a novamente atraente.
No regime de coivara a rotação entre as terras é intensa, o que exige que as comunidades possam dispor de diferentes áreas de plantio para intercalarem as plantações ao longo dos anos.
A partir de 1950, o sistema produtivo tradicional foi seriamente comprometido em função da instalação de unidades de conservação ambiental por todo o Vale do Ribeira. Tais unidades de conservação impuseram limitações de uso de terras a essas comunidades, impedindo a manutenção de suas práticas agrícolas tradicionais e ameaçando seriamente sua sobrevivência.
A agricultura de coivara continuou sendo praticada apenas nas porções do território sobre as quais não incidiam restrições ambientais ou em áreas menos acessíveis à vigilância da fiscalização, que muitas vezes coincidiam justamente com os piores lugares para a queima e o plantio.
Essa situação começou a reverter apenas na década de 1990, quando os quilombolas conseguiram sensibilizar os órgãos governamentais para sua causa, mas até hoje ainda há comunidades que enfrentam esse problema. Entre as medidas conquistadas está a alteração dos Parques Estaduais Jacupiranga e Intervales de forma a excluírem de seus limites as terras quilombolas.
A LUTA PELA TITULAÇÃO DOS TERRITÓRIOS

Os quilombolas do Vale do Ribeira foram os primeiros no Estado de São Paulo a se organizar para reivindicar seus direitos territoriais. No início da década de 1990, começaram a exigir o título de suas terras. Contavam então com o apoio da Diocese de Registro, da Comissão Pró-Índio de São Paulo e do Fórum Estadual de Entidades Negras de São Paulo, entre outras organizações.
Em 1994, a Comunidade de Ivaporunduva procedeu à autodemarcação de suas terras e, contando com a assessoria de um topógrafo contratado pela Diocese de Registro, elaborou um mapa com seus limites. Ainda com o apoio da diocese, foi realizada pesquisa por um etnólogo demonstrando a origem da comunidade. Com base nesses subsídios, a comunidade entrou com uma ação judicial requerendo a titulação de suas terras.

Em 1996, a Procuradoria da República instaurou um Inquérito Civil Público visando à adoção de todas as medidas cabíveis para titular as áreas quilombolas do Vale do Ribeira, com ênfase para aquelas que se encontram em áreas sobrepostas às unidades de conservação.

A fim de instruir o processo, ainda em 1996 a Procuradoria enviou uma técnica pericial em antropologia para proceder a pesquisa nas comunidades. Em seu relatório, a antropóloga concluiu pela necessidade de redefinição do traçado do Parque Intervales visando à exclusão das terras ocupadas pelas comunidades quilombolas.
Em 1998, os limites do parque foram alterados, abrindo caminho para as primeiras titulações de terras quilombolas.

Em janeiro de 2001, as comunidades de Maria Rosa, Pilões e São Pedro tiveram suas terras tituladas. Em 2003, foram tituladas as terras das comunidades de Ivaporunduva e Pedro Cubas.

Até maio de 2007, cinco áreas quilombolas já haviam sido tituladas na região do Vale do Ribeira. Mas ainda restam muitas titulações para serem feitas. 


AS COMUNIDADES

No Vale do Ribeira vivem cerca de 30 comunidades quilombolas. Cinco delas já conseguiram obter a titulação de suas terras: Ivaporunduva, São Pedro, Pedro Cubas, Pilões e Maria Rosa.
Conheça um pouco mais sobre a história e vida destas comunidades. 


IVAPORUNDUVA

Situada no município de Eldorado, Ivaporunduva é a mais antiga das comunidades do Vale do Ribeira e o ponto de partida dos fundadores dos demais bairros negros da região.
Registros documentais dizem que o povoado de Ivaporunduva surgiu no século XVII, a partir da chegada à região de dois irmãos mineradores e seus dez escravos. A partir de 1720 diversos mineradores, acompanhados de seus escravos, chegaram ao povoado.

Uma das primeiras pessoas a povoarem a região foi uma senhora chamada Joanna Maria, que chegou ao local com seus escravos e construiu uma casa onde atualmente é a sede da associação da comunidade.

Há documentação histórica narrando que essa senhora morreu em 1802, deixando suas terras como doação para seus escravos. No entanto, os quilombolas contam que, quando ela saiu para se tratar na cidade e morreu, escravos fugidos, que estavam nos arredores da região, se organizaram e tomaram a comunidade.

Segundo os moradores de Ivaporunduva, a origem da comunidade é anterior à data de 1720.

"Por volta de 1700, quem vivia aqui não eram mais os escravos. Só que eles viviam uma pressão muito forte, do pessoal que estava aqui para baixo e aqui para cima, que vinha aqui para pegar eles e levar de novo para vender. Vendiam em Iporanga, onde a mineração era muito forte, onde tinha muito dono de escravo", conta Benedito Alves da Silva, liderança da comunidade.
O maior símbolo de Ivaporunduva é a Capela de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Ivaporunduva, o mais antigo templo religioso existente no Alto Vale do Ribeira. Embora seu registro seja de 1791, os quilombolas contam que foi construída entre 1630 e 1690. A razão pela qual a construção teria demorado tanto seria o fato de os negros da região terem deixado de ser escravos justamente nesse intervalo de tempo.
Em 1972, a capela foi tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT), passando a ser reconhecidamente um patrimônio social da Humanidade.

Atualmente, ainda há culto na capela toda semana e missa uma vez por mês. A festa mais tradicional da comunidade é a comemoração do dia de Nossa Senhora do Rosário, celebrada todo dia 12 de outubro. "Tem quermesse, tem forró, tem frango no bingo", conta Benedito Alves da Silva.

A comunidade é formada por 70 famílias, que vivem em uma vila localizada na beira do Rio Ribeira do Iguape, e em casas espalhadas sertão adentro, até cinco quilômetros de distância da vila. A maioria das casas da vila é de alvenaria e coberta com telhas, mas no interior da comunidade as casas ainda são de sapé, pau-a-pique, com chão de barro socado. 
Foi a primeira comunidade a se organizar para lutar por sua terra. "No Estado de São Paulo nós fomos a primeira comunidade que teve coragem de, em 1993-94, entrar na Justiça pedindo que o governo reconhecesse nossa comunidade e desse o título para nós", conta Benedito.
Ele se refere à ação judicial que a associação de Ivaporunduva propôs, em 1994, contra União Federal, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, a Fundação Cultural Palmares e a empresa Alagoinha Companhia de Empreendimentos Gerais. Em 2002, essa ação foi julgada procedente, declarando a comunidade como quilombola e condenado a União emitir o título da terra.
Em 2003, o Governo do Estado de São Paulo titulou 672,28 hectares em nome da Comunidade de Ivaporunduva, o que corresponde apenas a 24,4% do total do território. A maior parte das terras da comunidade incide em uma área da Companhia Alagoinha de Empreendimentos Gerais e ainda não foi titulada.

No ano de 2005, o Incra abriu processo para a regularização dessa porção do território.  Em julho de 2006, o Incra publicou no Diário Oficial da União o relatório de identificação do território de Ivaporunduva  reconhecendo a ocupação pela comunidade de 2.715,6505 hectares.

Já em abril de 2007, o INCRA entrou com uma ação de usucapião na justiça federal. O objetivo dessa iniciativa foi regularizar da parcela do território de Ivaporunduva  incidente nas terras da Companhia Alagoinha de Empreendimentos Gerais. Optou-se por esse tipo de ação por trata-se de posse mansa e pacífica. A empresa supostamente proprietária da área jamais ocupou a área nem foi localizada para contestar o processo de titulação.

Em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA), a comunidade de Ivaporunduva desenvolve uma série de projetos visando gerar alternativas de manejo de seus recursos naturais e de geração de renda. São desenvolvidos projetos de plantação de banana orgânica, produção de artesanatos com palha de bananeira, repovoamento do palmiteiro juçara e coleta seletiva de lixo. Em maio de 2003, a comunidade conseguiu o certificado de banana orgânica, concedido pelo Instituto Biodinâmico de Botucatu. 

SÃO PEDRO

A comunidade de São Pedro começou a se formar a partir de 1830. Nesse período, com o declínio da mineração, os ex-escravos saíram em busca de novas terras que, embora ainda não valorizadas, fossem férteis para o plantio.
Os moradores de São Pedro contam que um dos primeiros homens a chegarem lá foi Bernardo Furquim. Dizem que chegou fugido e se instalou na localidade. Teve duas mulheres e ao menos 24 filhos, que foram se espalhando pela região.

Outros negros fugidos também chegaram a essas terras e se casaram com mulheres que já viviam pelo local, possibilitando sua fixação. Os filhos desses casamentos também se casavam com gente de fora, ampliando a ocupação da região.

Hoje, 39 famílias vivem na comunidade. Alguns moradores ainda vivem em casas de pau-a-pique, cobertas de sapé e com chão de barro; outros vivem em casas de alvenaria.

Em 2001 o Governo do Estado de São Paulo titulou 4.558,20 hectares em nome da Comunidade São Pedro, o que representa 97% da área total do território quilombola. O Incra abriu processo para regularizar o restante desse território. No entanto, até maio de 2007, o processo não tinha sido alvo de qualquer providência.

As famílias compartilham algumas hortas comunitárias, nas quais plantam arroz, feijão, mandioca, milho e café. Além disso, têm também um bananal, sendo que recentemente começaram a retomar a comercialização das bananas.

Todo ano acontece na comunidade a tradicional Festa do Dia de São Pedro (29 de junho). Muita gente de fora comparece à festa. É uma grande quermesse, com música, dança, jogos e rifas.

Durante a festa, há a apresentação da "dança da mão esquerda", uma dança de origem africana que é praticada e cultivada pela população da comunidade. A música que tradicionalmente a acompanha é tocada ao vivo com viola, atabaque e pandeiro. 

PEDRO CUBAS

Esta comunidade se formou a partir da reunião de negros fugidos de fazendas da região. Os moradores contam que a primeira pessoa a se instalar lá foi Gregório Marinho, um escravo que havia acabado de fugir de uma fazenda chamada Caiacanga e montou um acampamento na cabeceira do Rio Pedro Cubas, num local que viria a ser conhecido como Praia de Gregório Marinho. Outros escravos também fugidos se juntaram a ele, dando origem a um povoado que posteriormente viria a ser a comunidade de Pedro Cubas.
A relação de Pedro Cubas com outras comunidades do Vale do Ribeira é bastante forte. Sabe-se, por exemplo, que famílias de Pedro Cubas e de Ivaporunduva têm origem comum. O próprio Gregório Marinho, que é considerado o primeiro habitante de Pedro Cubas, aparece em documentos das duas comunidades.

A comunidade conta atualmente com 40 famílias.

As terras de Pedro Cubas foram parcialmente tituladas em 2003 pelo governo do Estado de São Paulo. A área regularizada (3.806,23 hectares) corresponde a 64% do território total. Apesar da titulação, ainda permanecem na área ocupantes não-quilombolas.
No ano de 2004, o Incra instaurou processo com vistas a regularizar esse território. Em maio de 2007, o relatório de identificação e delimitação da área estava em elaboração.






 PILÕES


A comunidade de Pilões, formada por 51 famílias, está situada no município de Iporanga, na região do Alto Ribeira, em um local distante da cidade e de difícil acesso. Para chegar até a comunidade, deve-se atravessar o Rio Ribeira do Iguape e andar por dez quilômetros em uma estrada não-pavimentada, que atravessa a Serra de Pilões e segue margeando o Rio Pilões e seus afluentes.

No Livro de Tombo da Paróquia de Xiririca, Pilões aparece como o último dos 54 bairros da Paróquia, e a origem de seu nome é assim explicada: "Pilloens, Ribeirão. Bairro e Demarcação superior. O nome desse coudaloso rio, cheio de cachoeiras, provem ao que dizem, de achar-se n´aquelles tampos antigos hú pilão de madeira ou no mato, ou no mesmo rio".



Os moradores contam, porém, que o nome Pilões foi dado porque existiam muitos buracos nas pedras do rio iguais a um pilão.

O bairro era conhecido como Porto de Pilões, pois era onde as embarcações descarregavam mercadorias para a sede das fazendas que utilizavam mão-de-obra escrava.

Os relatos dos moradores contam que, no século XVII, moravam na região senhores brancos com seus escravos. Em um primeiro momento, concomitante do tempo da mineração, a ocupação dessa região foi marcada pela presença da escravidão. Os escravos resistiam, se rebelavam, fugiam e formavam quilombos.
Há registros de um documento, datado de 1863, no qual o subdelegado de polícia de Iporanga noticia à presidência da Província comunicando a existência de negros em quilombos nas proximidades da região e pedindo providências para destruí-los.

As terras de Pilões foram parcialmente tituladas em 2001 pelo governo do Estado de São Paulo com 5.925,99 hectares, o que corresponde a 95% do território total.

O Incra abriu processo para regularizar as terras de Pilões. No entanto, até maio de 2007, nenhuma providência tinha sido implementada. 

MARIA ROSA

Situada praticamente em frente a Pilões, na região do Alto Ribeira, a comunidade de Maria Rosa também se formou em um local distante e de difícil visibilidade. Escravos fugiam para o local, onde se instalaram e desenvolviam atividade agrícola para sobreviver.
De acordo com os relatos e documentos disponíveis, acredita-se que houve uma ocupação territorial negra em Maria Rosa e em Pilões, na mesma época em que algumas fazendas da região ainda contavam com o trabalho escravo.

Em um documento de 1863, o subdelegado de polícia de Iporanga noticia à presidência da Província comunicando a existência de negros em quilombos nas proximidades da região e pedindo providências para destruí-los.

A partir de 1844, os registros de batismo começam a indicar a presença de negros livres nos arredores da região.

A comunidade é formada atualmente por 20 famílias.

As terras de Maria Rosa foram tituladas em 2001 pelo governo do Estado de São Paulo com 3.375,66 hectares.




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De acordo com o Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva - Cedefes, existem aproximadamente 400 comunidades quilombolas no Estado de Minas Gerais distribuídas por mais de 155 municípios. As regiões do estado com maior concentração de comunidades quilombolas são a região norte e a nordeste, com destaque nesta última para o Vale do Jequitinhonha.

De acordo com dados apresentados pelo Cedefes, a maior parte das comunidades quilombolas do estado apresenta-se em contexto rural. No entanto, Minas Gerais se destaca pela presença significativa de quilombos em áreas urbanas.

A morosidade do governo em proceder a titulação de suas terras foi a principal razão que motivou as comunidades quilombolas a se unir em busca da garantia de seus direitos. No ano de 2004, elas criaram a N´Golo, a Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais.

A organização dos quilombolas tornou visível a sua história de resistência, trouxe a valorização da auto-estima e ainda resultou na criação de programas governamentais especiais para suas comunidades. Essas são conquistas que os homens e as mulheres quilombolas se orgulham. Como desafio permanecem a luta pelo reconhecimento e a titulação de seus territórios. Até junho de 2007, uma única comunidade em Minas Gerais havia conseguido a titulação de suas terras: Porto Corís.

Atendendo as reivindicações dos quilombolas, a Superintendência do Incra em Minas Gerais abriu diversos processos para a titulação de terras de quilombo. Em maio de 2007, estavam em tramitação 67 processos. No entanto, 61 deles apenas haviam recebido um número de protocolo, ou seja, nenhuma medida efetiva havia sido tomada pelo governo no sentido de encaminhar a regularização daqueles territórios.

Em Minas Gerais, a luta pela terra quilombola apresenta-se imbricada na luta pelo acesso à água e pela preservação do meio ambiente. Ao enfrentar a seca, os grandes projetos de desenvolvimento (hidrelétricas e mineração principalmente), as monoculturas de eucalipto e a especulação imobiliária, no caso dos quilombos urbanos, essas comunidades tentam fazer valer o seu direito de permanecer em terras conquistadas por seus antepassados.


A HISTÓRIA DA PRESENÇA NEGRA EM MINAS GERAIS

A descoberta de ouro e posteriormente de diamante provocou um intenso fluxo migratório para Minas Gerais em fins do século XVII. A promessa de enriquecimento rápido atraiu pessoas de vários lugares do Brasil. Bandeirantes paulistas, “na caça ao índio, ao ouro e às esmeraldas”, juntamente com baianos e pernambucanos migraram e trouxeram consigo um grande contingente de negros escravos (Silva, 2005: 68).
A escravidão foi a forma dominante de organização do trabalho no surgimento da sociedade mineira (Ramos, 1996). A necessidade de mão-de-obra para a exploração mineral e a ávida corrida pelo ouro durante a primeira metade do século XVIII fizeram com que o valor de um negro escravo na região fosse muito maior que no restante do país.

A demanda por trabalhadores bem como as dificuldades encontradas com o tráfico valorizaram o preço da mão-de-obra. Tal valorização estimulou proprietários de escravos de São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco a também migrar para as Minas, onde os negócios tornaram-se mais rendosos. O fluxo de migrantes e a grande riqueza mineral da região fizeram com que Minas Gerais se transformasse no centro do poder econômico do país durante o século XVIII.

Nos anos em que a mineração foi economicamente rendosa, foram empregados nas minas cerca de 500 mil negros (Silva, 2005: 72).  Entre 1700 e 1850, época do apogeu da mineração, vieram para Minas Gerais 160 grupos de negros africanos de três regiões: os sudaneses (especialmente do Golfo da Guiné: haussas, minas, iorubas, malês, entre outros), os bantus (angolas, congos, bengueleas) e os moçambiques. Desde o século XVIII, a população negra no estado nunca foi inferior a 30% da população total – índice considerado alto (Silva, 2005).

A Resistência
Os quilombos marcaram esse período da história de Minas Gerais. A formação de quilombos foi intensa na região. Muitos foram os negros que lutaram contra o cativeiro. Segundo pesquisa realizada por Silva (2005), no período de 1710 a 1798, existiram cerca de 120 quilombos em Minas Gerais.

Os quilombos nessa região, ao contrário do que rege o imaginário popular, não se constituíram apenas em lugares ermos, distantes dos centros urbanos: “Os quilombos em Minas Gerais não existiam isolados; em geral, os escravos não fugiam para muito longe das comunidades mineradoras urbanizadas” (Ramos, 1996: 165).

Nas proximidades das vilas e cidades formaram-se numerosos pequenos quilombos, a maioria sem nome ou identificada por sua localização. Essa proximidade facilitava a fuga de outros escravos.

A repressão aos quilombos em Minas Gerais teve como primeira manifestação a criação do cargo de “capitão-do-mato”. No entanto, essa providência não controlou as fugas e a criação de sucessivos novos quilombos.

Os quilombolas ou calhambolas, como eram chamados os negros fugitivos em Minas Gerais, eram acolhidos por comerciantes que negociavam com eles (Ramos, 1996). Muitos comerciantes preferiam comprar dos quilombolas, pois o preço era mais baixo. Diversos fazendeiros também solicitavam os serviços desses negros como estratégia para que eles não se rebelassem e atacassem suas propriedades.

Por sua vez, os quilombolas precisavam vender seus produtos (cultivados, extraídos – no caso do minério – ou roubados) para garantir sua sobrevivência. Assim, a proximidade geográfica de pequenos quilombos aos centros urbanos era interessante tanto para quilombolas quanto para muitos setores da sociedade livre.

O espaço mais utilizado pelos negros para negociar seus produtos, trocar informações e estabelecer solidariedade eram as vendas. Essas vendas ou tabernas, na sua maioria, eram controladas por mulheres forras ou escravas que mantinham um estreito trato com o público. As mulheres controlavam o comércio não somente nas vendas, que ocupavam determinado espaço físico, mas também no comércio ambulante. Eram as chamadas negras do tabuleiro ou quitandeiras (Silva, 2005).

Essa condição dava às mulheres negras um papel estratégico. Mulheres forras, as quitandeiras circulavam com seus tabuleiros a vender seus produtos a escravos, livres, quilombolas e autoridades. Sempre bem informadas, elas avisavam os quilombolas sobre as investidas de repressão e facilitavam as trocas comerciais entre os negros fugidos e os demais grupos da sociedade. Além disso, elas forneciam gêneros alimentícios a escravos e os auxiliavam em suas fugas, escondendo-os em suas residências (Silva, 2005: 196).

Tal fato não passou despercebido das autoridades que chegaram a instituir leis para controlar e diminuir as atividades comerciais das mulheres negras. Como a maioria da população negra escrava na época era urbana, as várias tentativas de proibir a circulação de escravos fracassaram.

Os negros fugidos circulavam e mantinham contatos com os residentes. Como a população urbana era em grande escala composta por pessoas “de cor”, os negros fugidos circulavam de forma despercebida pelas autoridades nas cidades. Somado a esse fator, os quilombolas contavam também com o apoio da população escrava e de parcela da população livre. A relação entre quilombolas e moradores nas Minas era fluida e foi um dos fatores que dificultou sobremaneira a repressão contra esses grupos.

Foi contra o cativeiro e pela liberdade que os negros levados para Minas Gerais lutaram. Por meio de diferentes formas de resistência, os negros conquistaram seu espaço em terras mineiras. A fuga, a ocupação de áreas não povoadas após a abolição ou mesmo o recebimento de glebas de terra de seus (antigos) proprietários por doação ou herança foram as formas de conquista e consolidação dos territórios negros em Minas Gerais. Contudo, no Brasil contemporâneo, essas terras, juntamente com sua história, estão ameaçadas. 

QUILOMBOS URBANOS
Ao contrário do que rege o imaginário popular, os quilombos existentes no período colonial não eram compostos apenas por negros escravos fugidos nem mesmo eram localizados apenas em lugares ermos e isolados. Em Minas Gerais, muitos pequenos quilombos se fixaram nos arredores das vilas, centros urbanos e fazendas. Assim sendo, a manifestação recente de comunidades negras urbanas como remanescentes de quilombo não deve causar estranhamento.
Muitos quilombos tornaram-se urbanos em função do crescimento acelerado das cidades nos séculos XIX e XX. “Engolidos” por elas, os quilombos foram gradativamente envolvidos pelas áreas residenciais urbanas recém-constituídas, tornando-se alvo de intensa especulação imobiliária.

Em função da expansão dos centros urbanos, vários territórios quilombolas foram “inseridos” e se tornaram parte de um espaço até então compreendido como outro. No entanto, com base em uma origem negra escrava e movidos pelo desejo de manter ou reconquistar uma vida em comunidade, os quilombolas urbanos, bem como os quilombolas rurais, compartilham uma mesma história e um mesmo objetivo: a valorização de seu passado de luta e resistência. Assim se manifesta Walter da Silva, 56 anos, morador do quilombo Mangueiras, “não existe diferença entre quilombo urbano e quilombo rural. A questão é só localidade” (entrevista em 01/04/2007).

A proximidade geográfica dos quilombos aos centros urbanos ou mesmo o seu compartilhamento com as cidades não podem ser entendidos como fator que os descaracteriza como tal, pois não são as características do local e seu entorno que proporcionam identidade aos negros que ali residem, mas sua história vivida e projetada.

O quilombo urbano, segundo a pesquisadora Carril, se organiza em um meio que lhe é hostil: “No urbano, não se planta, não se pesca e nem se coletam frutos da mata. Na cidade fragmentada, os grupos se solidarizam para recuperar a auto-estima em situações de marginalização social” (Carril, 2006: 11). Para a pesquisadora, a identidade quilombola é construída em função de uma história de luta e escassez – e essa história comum unifica o que o contexto espacial parece dividir: o quilombo rural e o quilombo urbano.

Na região metropolitana de Belo Horizonte, até março de 2007, três comunidades quilombolas haviam sido identificadas: Arturos, Luízes e Mangueiras (Cedefes, 2007).  No entanto, o número de quilombos urbanos em Minas Gerais é maior. A pesquisa realizada pelo Cedefes destaca a existência de quilombos urbanos que foram formados pela migração de uma comunidade para uma determinada área urbana em função da perda de suas terras. Segundo o Cedefes, essa é a história de formação das comunidades do Baú, em Araçuaí, na região do Vale do Jequitinhonha; a dos Amaros, em Paracatu, na região Noroeste; e a de Palmeiras, no município de Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, que surgiu em função da aglomeração de trabalhadores negros da linha ferroviária.
 

LUÍZES


O quilombo Luízes localiza-se na capital mineira, em um bairro de classe média alta, denominado Grajaú, e soma aproximadamente cem pessoas. Sua origem remete ao final do século XIX, quando a região ainda era conhecida como Curral Del Rei.
A comunidade tem sido historicamente liderada por mulheres. A memória oral do grupo traz Anna Apolinária Lopes como sua principal ancestral. Segundo dona Luzia Sidônio, presidente da Associação Quilombola Luízes, Anna Apolinária é quem dava as ordens no quilombo, inicialmente denominado “Quilombo das Piteiras”.

Esse nome foi escolhido em função da presença de árvores cujas folhas grossas, longas e aceradas fornecem boas fibras. Segundo dona Luzia, com a planta (pita), que se assemelha a um tipo de cizal, seu povo confeccionava perucas, cachos e enchimento para os cabelos (Sidônio, 1998: 18).

A matriarca dos Luízes, também conhecida como Anna Mãe, Anna Guerreira, Anna Terra ou Anna Escrava, foi amasiada do homem que era seu proprietário, ainda no século XVIII. Dele teria herdado um terreno no atual município de Nova Lima, localizado a 22 quilômetros de Belo Horizonte.

A agricultura era a base da subsistência do grupo, juntamente com a manufatura da pita e do coco licuri. Da pita, eles fabricavam perucas, cachos e enchimentos para cabelos. Do coco licuri, eles produziam óleo de cozinha e sabão.

A Migração
Segundo dona Luzia, até 1930 a comunidade se manteve nas terras doadas à matriarca. No entanto, a chegada da empresa multinacional Saint John Del Rey Mining Company Limited (conhecida como Companhia Morro Velho) e sua busca por minério na região acabaram por resultar em uma barganha de terras entre a empresa e os quilombolas.

Na área adquirida originalmente pela empresa – fazenda Bom Sucesso – não foi encontrado minério algum. Para evitar o fracasso do negócio, a empresa trocou a sua área pelas terras dos descendentes de Anna Apolinária (Sidônio, 1998). A troca fez com que o grupo se mudasse para uma área onde outros parentes já habitavam e onde, posteriormente, foi construída a nova capital mineira, Belo Horizonte.

Nicolau Nunes Moreira e sua esposa foram os primeiros Luízes a seguir para a futura nova capital. Ali trabalharam e compraram uma “sorte de terra” (Sidônio, 1998: 27). Para lá levaram mudas de pita a fim de dar continuidade ao trabalho de confecção de perucas. À nova morada, localizada na atual região oeste da capital, onde hoje se encontra o quilombo Luízes, deram o nome “Fazenda Piteiras”.

Segundo Luzia, havia duas famílias descendentes de escravos no início do século XX na área onde hoje se encontra Belo Horizonte: os Luízes e os Cândidos. Essas duas famílias uniram-se através do casamento, como foi o caso de Quirino Cândido de Jesus com Eulália Luiz e Francisco Cândido (tio Chico) com Aurora Luiz.

Como os descendentes de Anna Apolinária carregam consigo o sobrenome Luiz, a comunidade passou então a ser denominada Luízes.

A Resistência
Atualmente, a área ocupada pela comunidade na capital mineira possui grande valor imobiliário. A especulação e o preconceito da sociedade têm pressionado a saída dos Luízes da região. Sobre a luta e resistência atual, dona Luzia comenta:

Como todo cidadão pagamos impostos e taxas. Embora sejamos proprietários dessas terras, somos discriminados, humilhados e mortos pelos especuladores. Nossos vizinhos burgueses dizem e deixam bem claro que este bairro não é para negros. Nós, os Luízes, lutamos até a morte em defesa de nossos direitos, como é o caso de Cordelina, morta por lutar pela nossa comunidade; e tentamos resistir às grandes construtoras, que já tomaram grande parte de nossa fazenda. Tudo isto porque somos uma raça em luta há mais de trezentos anos, aparentemente privilegiada pela Lei Áurea, que veio apenas para beneficiar os senhores latifundiários e não os negros, porque liberdade mesmo ainda não tivemos (Sidônio, 1998: 39-40).
A luta dos Luízes não é diferente da luta travada pela maioria dos quilombolas no Brasil: a necessidade de garantir a posse e a propriedade de um território historicamente conquistado. A especificidade do caso reside no fato desse território localizar-se hoje em uma área urbana extremamente valorizada. As construtoras ambicionam os terrenos e desejam a saída dos quilombolas tanto quanto os moradores que acreditam na maior valorização imobiliária sem a presença dos negros.
A comunidade dos Luízes possui aproximadamente cem pessoas que residem no bairro Grajaú e mais de 300 pessoas espalhadas pela cidade de Belo Horizonte. Segundo Luzia, muitos não conseguiram resistir à pressão e alugaram seus imóveis, seguindo para outras regiões da cidade.

Dona Luzia se orgulha ao dizer que na comunidade não há analfabetismo, e com relação aos projetos para seu povo, ela apresenta o sonho de construírem uma capela, um espaço para realização de cursos profissionalizantes e um espaço para o resgate e manifestação cultural. Todavia, ela conclui: “para isso é necessário garantirmos a nossa permanência aqui”.


QUILOMBOS RURAIS
Minas Gerais foi um dos estados brasileiros que possuiu maior população negra escrava no país. A mineração atraiu pessoas de vários lugares para essa região, que prometia enriquecimento fácil e rápido. Muitos foram os que trouxeram ou adquiriram escravos para o trabalho pesado nas minas.
A fuga dos escravos e a conquista de terras para viver em liberdade marcaram a história das Minas Gerais. Um grande número de quilombos se formou nessa região. Após a abolição da escravatura, muitos permaneceram nos territórios conquistados por seus antepassados ou ocuparam novos espaços a fim de iniciar uma vida de liberdade. Nessa trajetória histórica, muitos territórios foram ocupados. Atualmente, os descendentes de escravos lutam para conseguir se manter em suas terras e ter seu direito de propriedade sobre elas.

Hoje, são mais de 400 comunidades quilombolas que lutam por seus direitos em Minas Gerais. A maioria delas localiza-se na zona rural e algumas em centros urbanos. As regiões do estado com maior concentração de comunidades quilombolas são a região norte e a nordeste, com destaque nesta última para o Vale do Jequitinhonha.

BREJO DOS CRIOULOS
A comunidade Brejo dos Crioulos localiza-se nos municípios de São João da Ponte e Varzelândia, região norte de Minas Gerais. De acordo com Mamede Moreira da Silva, presidente da Associação Quilombola de Brejo dos Crioulos, a comunidade agrega 684 famílias. Brejo dos Crioulos é uma das maiores comunidades quilombolas no estado.
Localizada na região da bacia do rio Verde Grande, ela compõe a rede de comunidades negras rurais no norte mineiro. Às margens do ribeirão Arapuim, a comunidade, atualmente, está estruturada em diversos grupos locais: Araruba, Arapuim, Cabaceiros, Caxambu, Conrado e Furado Seco (Costa, 2001: 100).
Origem da Comunidade
A origem de Brejo dos Crioulos remete ao período em que as terras do Vale do rio Verde Grande eram ainda consideradas impróprias para a presença humana. Sua mata, além de dificultar o acesso, favorecia a existência de insetos causadores de várias doenças tropicais, como a malária. Em função disso, a região ficou conhecida como Mata da Jaíba – o termo jaíba teria origem tupi e significaria águas ruins ou fruta ruim (Costa, 2001: 105).

Considerada insalubre, ela não foi alvo da ambição colonizadora durante os séculos XVIII e XIX. Nesse sentido, tornou-se a principal área de fuga dos negros escravos da região. Em sua determinação por liberdade, eles enfrentaram as dificuldades e se instalaram gradativamente naquelas matas. E se, inicialmente, o aspecto geográfico já era considerado um empecilho para sua ocupação pelos setores dominantes da sociedade mineira, a presença negra consolidou a visão do lugar como inadequado e impróprio.

Essa é uma das explicações apresentadas para a origem da ocupação da região. Outra análise entende que as oligarquias locais teriam enviado seus escravos para a região a fim de que dessem início ao afazendamento de terras que possuíam em áreas insalubres (Costa, 2001: 109). Essas duas perspectivas, apesar de discordarem em aspectos relevantes, reconhecem a ocupação negra do território.

Desvalorizadas por causa da insalubridade e da presença de negros fugidos ou forros, as matas do Jaíba permaneceram livres de grandes disputas nos séculos XVIII e XIX – fato que permitiu aos negros se instalarem naquele território e ali criarem raízes e uma vida de liberdade.

Vários foram os grupos negros que ocuparam aquelas matas, dentre eles, os ancestrais da comunidade Brejo dos Crioulos. Ao traçar a genealogia de seus grupos familiares, o pesquisador João Batista Costa constatou vínculos entre eles e diversas comunidades negras na região. Tal constatação o permitiu afirmar existir ali não um grupo ou uma comunidade, mas uma rede de grupos negros, a que ele definiu como Sociedade Negra da Jaíba (Costa, 2001: 112).

A necessidade dos quilombolas de adquirir bens fez com que procurassem locais onde pudessem trocar seus produtos. As idas até as vilas aconteciam com freqüência. Apesar da punição prevista em lei, eles estabeleceram relações comerciais de trocas com outros setores da sociedade: taberneiros, pequenos fazendeiros, cativos e outros quilombolas. A teia de relações construída pelos quilombolas chama a atenção.

Nas trilhas percorridas até os centros urbanos, encontravam também outros agrupamentos de negros. Gurutuba, Mocambinho, Campo Redondo e Contendas foram alguns dos diversos grupos negros com quem os quilombolas de Brejo dos Crioulos estabeleceram relações de troca. Estabelecido o contato entre os grupos, as festas de seus santos também se tornaram motivo para o encontro e, muitas vezes, para a união entre homens e mulheres. Para João Batista “como linhas ligando nós em uma rede”, as comunidades estabeleceram vínculos que lhes permitiram compor uma sociedade específica (Costa, 2001: 112).

A Luta pela Terra
Foi somente no século XX que a região da Jaíba se tornou atrativa para a sociedade em geral, por causa da construção de uma estrada de ferro nas proximidades da Serra do Espinhaço. A estrada de ferro resultou na valorização das terras e nas conseqüentes disputas fundiárias na região. O território negro tornou-se então alvo de grande interesse econômico.

A partir da década de 1940, a região tornou-se alvo de disputas com fazendeiros que se utilizaram da violência para expulsar famílias inteiras de suas terras. Dois conflitos tornaram-se mais conhecidos por terem ocorrido assassinatos e serem denunciados em listas divulgadas por entidades não governamentais, como a Comissão Pastoral da Terra (Costa, 2001: 101). O pesquisador João Batista descreve esse período como anos de terror:

Quando famílias inteiras sofreram as mais atrozes violências, sendo obrigadas muitas vezes a se esconderem nas matas que circundavam suas casas, vê-las sendo queimadas e seu gado roubado. Para não serem mortos, tiveram que fugir para outros lugares, depois de venderem seus bens a tronco de pinga, lenços e quase nada em dinheiro para aqueles que cobiçaram suas terras. Desde essa época, fugindo ao horror da violência fazendeira apoiada pelo poder municipal, parte de seus parentes espalharam-se pelo país inteiro, fugindo, como seus ancestrais, para outros lugares para manterem-se vivos (Costa, 2001: 101-102).
Pressionados a vender suas terras por bens ou valores insignificantes, famílias quilombolas foram expulsas de suas terras. Migraram para cidades ou para outras áreas rurais por causa da pressão e da violência ali instaladas. A vida em comunidade foi drasticamente afetada e o território negro dividido.
Atendendo as reivindicações dos quilombolas, o Incra abriu, em dezembro de 2003, o processo de regularização do território de Brejo dos Crioulos. Em maio de 2007, segundo informações oferecidas pela superintendência do Incra de Minas Gerais, o relatório já havia sido concluído mas ainda não publicado no Diário Oficial da União.

A morosidade do órgão governamental e a tensão vivida na região levaram os quilombolas a ocupar, no dia 20 de maio de 2007, a fazenda Vista Alegre, localizada no perímetro do território tradicional de Brejo dos Crioulos. A ocupação resultou na reação violenta de um dos empregados da fazenda, que disparou tiros e feriu dois quilombolas.



N’GOLO – FEDERAÇÃO DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS DE MINAS GERAIS

O nome N’Golo possui origem africana. Como uma dança ritual dos mucopes em Angola, região sul da África, N’Golo também é popularmente conhecido como “dança da zebra”. Com base nos movimentos realizados por esse animal quando os machos, em um combate violento, disputam entre si sua fêmea, N’Golo se constituiu como uma dança ritual dos jovens homens mucopes para conquistar suas esposas.

Em função do tráfico negreiro para o Brasil, muitos foram os conhecedores dessa dança ritual que vieram para cá. A necessidade de resistir à escravidão, no entanto, fez com que percebessem que os seus movimentos, marcadamente de pernas, poderiam ser utilizados como luta e combate pessoal. Assim, o N’Golo ficou conhecido no Brasil como a dança ritual que deu origem à capoeira, tendo sido difundido como símbolo de resistência e luta dos afro-descendentes.

A N’Golo, Federação Estadual das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais, foi criada no ano de 2005 com o apoio de várias entidades, dentre elas, o Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes), organização não governamental com sede em Belo Horizonte e que se dedica às questões indígena, quilombola e dos trabalhadores e trabalhadoras rurais no estado desde a década de 1980.

A idéia de criar uma organização estadual das comunidades quilombolas adveio dos próprios quilombolas que entenderam ser fundamental sua articulação. O movimento que culminou com a criação da Federação teve início em 2003, quando vários eventos sobre os direitos quilombolas proporcionaram a mobilização das comunidades.

Em 2004, foi realizado o “1º Encontro das Comunidades Negras e Quilombolas de Minas Gerais”, organizado pela Fundação Cultural Palmares e pelo Instituto de Defesa da Cultura Negra e Afro-descendentes – “Fala Negra”. Nesse encontro, os participantes discutiram seu direito ao território cultural bem como as políticas públicas direcionadas aos remanescentes de quilombo no país. Os debates nesse encontro evidenciaram aos quilombolas a violação de seus direitos básicos. Assim sendo, eles criaram uma Comissão Provisória Quilombola, com eleição de representantes por região do estado, com a finalidade de representá-los na luta por seus direitos.

A comissão eleita realizou duas reuniões ao longo do ano de 2004, para então, em junho de 2005, finalmente, através de uma assembléia com ampla participação quilombola, consolidar sua organização política e fundar a Federação Estadual das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais.

A direção da Federação é composta por uma diretoria e um conselho fiscal com mandato de três anos. A diretoria da Federação é formada por seis diferentes cargos: Diretor Presidente; Diretor de Administração e Finanças; Diretor de Educação Política, Formação e Comunicação; Diretor de Promoção da Igualdade Racial e Direitos Humanos; Diretor de Etnodesenvolvimento Sustentável; e Coordenadora da Comissão Estadual de Mulheres. E o Conselho Fiscal é formado por seis pessoas, sendo três titulares e três suplentes.

As Conquistas e os Desafios
A Federação já conseguiu realizar reuniões internas, visitas em algumas comunidades e promover o “2º Encontro das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais”, que aconteceu no período de 30 de março a 1º de abril de 2007, no município de São João da Ponte.

Um dos resultados da ação da federação foi a abertura de novos processos para a titulação de terras quilombolas pela Superintendência do Incra em Minas Gerais. Em junho de 2005, quando foi fundada a Federação, existiam cerca de 20 processos abertos no Incra em Minas Gerais. Em dezembro desse mesmo ano, o número havia duplicado para 40 processos.

Na opinião de Gilberto Carvalho, diretor de Administração e Finanças da Federação e membro da comunidade de Porto Pontal, a questão fundiária é o maior desafio a ser enfrentado. Segundo ele, o Incra em Minas Gerais tem se mostrado omisso e moroso e o governo estadual contrário aos direitos quilombolas. Para Gilberto, a falta de vontade política é a principal razão de o estado ter apenas uma terra quilombola titulada, tendo sido esta inundada pelas águas do reservatório da hidrelétrica de Irapé. Segundo ele, essa falta de vontade política torna-se evidente quando os políticos não fazem chegar até as comunidades os programas federais destinados aos quilombolas no país.

Sandra Maria da Silva, Coordenadora da Comissão Estadual de Mulheres, considera que um dos principais objetivos da Federação é identificar mais comunidades quilombolas no estado, além de articular e levar informações para as pessoas sobre seus direitos.

No que diz respeito à regularização fundiária, Gilberto Carvalho espera que a Federação consiga, através do seu trabalho, provocar a agilidade necessária para a demarcação e titulação definitiva das terras de quilombo em Minas Gerais. Segundo ele, “a união das famílias, das comunidades, vai conseguir mudar esse país”.

Para seu José Pastor, 52 anos, quilombola da comunidade de Barro Preto, região de Itabira, a Federação é muito importante, pois “a gente tem como desabafar os problemas e entender as coisas”.

A Federação ainda não possui uma sede própria e seus recursos ainda são insuficientes para realizar as atividades desejadas. No entanto, a trajetória dessa organização apenas deu seus primeiros passos. A expectativa é que, através da articulação e da organização dos próprios quilombolas, sua luta adquira maior visibilidade e força política.

Entre em contato com a Federação N’Golo
Rua Padre Marinho nº 455, 3º andar
30140-040 – Belo Horizonte – MG


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Há notícias da existência de ao menos 15 comunidades quilombolas no Estado do Rio de Janeiro. Aproximadamente metade delas está localizada na região litorânea do Estado, nos municípios de Búzios, Cabo Frio, São Pedro da Aldeia, Rio de Janeiro, Mangaratiba, Angra dos Reis e Paraty.   As demais comunidades estão localizadas no interior no Estado, nos municípios de Quissamã, Vassouras, Valença, Quatis e Rio Claro.
Até abril de 2006, apenas duas comunidades do Rio de Janeiro já tinham suas terras tituladas: Campinho da Independência e Santana. Outras 20 comunidades têm processos em curso no INCRA e nas instâncias estaduais. 



A RESISTÊNCIA EM MARAMBAIA

Marambaia fica localizada em uma ilha no município de Mangaratiba, no litoral do Estado do Rio de Janeiro. Em abril de 2006, viviam na comunidade 156 famílias.
A história de Marambaia está diretamente relacionada com o tráfico de escravos do século XIX. Era na ilha de Marambaia que o Comendador Breves, um importante senhor do café e do tráfico de escravos da época, deixava seus escravos em um período de "engorda", antes de serem vendidos para outros senhores. Há notícias de que por lá passaram pelo menos seis mil escravos.
A herança
Segundo contam os moradores da ilha, antes de morrer, em 1889, Breves doou toda a ilha para os ex-escravos que ainda permaneciam nela. No entanto, como realizou essa doação apenas verbalmente, sua família não cumpriu esse compromisso e em 1891 vendeu as terras para a Companhia Promotora de Indústrias e Melhoramentos. Em 1905, a ilha foi adquirida pela União.

Os quilombolas continuavam vivendo no local quando, em 1939, o Presidente da República Getúlio Vargas doou a ilha para a construção de uma escola profissional de pesca, a Escola Técnica Darcy Vargas, que era mantida por uma instituição ligada à Igreja denominada Abrigo Cristo Redentor.

Seguiu-se então um período de grande prosperidade para a ilha da Marambaia e para seus moradores. Os quilombolas passaram a ter acesso a hospital e outros serviços públicos que antes não dispunham, além de poderem cursar a escola de pesca e ter à sua disposição fábricas de gelo e sardinha.
Os conflitos com a Marinha
Em 1971, com a decadência da escola, a área na qual está localizada a ilha da   Marambaia foi reincorporada à União, que delegou sua administração ao Ministério da Marinha. Em 1981 foi inaugurado o Centro de Adestramento da Ilha de Marambaia.

A chegada da Marinha marcou o início de um período difícil para os moradores da ilha, que começam a ter seus direitos cerceados e uma série de restrições impostas. Os comunitários passaram a não ter mais acesso à oferta de serviços públicos. Foram proibidos de continuar realizando as roças de subsistência que sempre cultivaram bem como de construir novas casas e de reformar ou ampliar as existentes.

Em 1998 passam a ser alvo de uma série de ações judiciais de reintegração de posse movidas pela União Federal. As ações são propostas individualmente, objetivando desmobilizar a comunidade e expulsar os moradores. Em algumas delas os quilombolas foram derrotados e expulsos da ilha.
A resistência
Diante das ameaças, a comunidade começou a organizar sua resistência, contando com o apoio de diversos setores e organizações da sociedade.

Em 1998 a comunidade e a Diocese de Itaguaí organizaram um primeiro dossiê sobre a situação das famílias da ilha e o enviou para várias autoridades, entre elas o então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso. Já em 2001, a organização não-governamental Koinonia começa a trabalhar com a comunidade.  

Em fevereiro de 2002 o Ministério Público Federal entrou com uma ação civil pública contra a Marinha, exigindo a suspensão das ações contra os moradores, e a Fundação Cultural Palmares, exigindo a conclusão do processo de titulação das terras da comunidade (na época, era esse o órgão responsável pela titulação de terras quilombolas).

Em maio de 2002 o juiz julgou parcialmente deferida a liminar requerida pelo MPF e determinou que a União se abstivesse de adotar medidas para desocupar as casas dos moradores da comunidade, não destruíssse ou danificasse essas casas e tolerasse que os moradores mantivessem seu estilo de vida tradicional, plantando roças e realizando eventuais obras em suas residências. No entanto, não concordou com o pedido de permitir o retorno dos moradores que foram retirados às suas antigas casas.
Até abril de 2006 o juiz ainda não havia julgado a ação, e essa liminar ainda continuava valendo.
Apesar da liminar, a Marinha ainda continuava impedindo que os moradores plantassem suas roças ou realizassem reparos em suas residências.

No final de 2005 a Marinha procurou também impedir que o INCRA e outras entidades que realizam trabalhos com a comunidade entrassem na ilha.   A entrada dos técnicos do INCRA para a realização do cadastramento das famílias e da demarcação da área, em fevereiro de 2006, só foi possível devido a uma decisão judicial, em uma ação civil pública, movida pelo Ministério Público Federal, que determinou que a Marinha se abstivesse de impedi-la.

Para lutar contra essa situação, a Associação de Remanescentes de Quilombos da Ilha da Marambaia (ARQIMAR) e a Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Estado do Rio de Janeiro (ACQUILERJ), juntamente com o Koinonia, a FASE e outras entidades da sociedade civil, lançaram, em março de 2006, a Campanha Nacional Marambaia Livre!. O objetivo da campanha é tornar públicas as violações de direitos sofridos pela comunidade e lutar pela titulação da área.

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No litoral norte do Estado de São Paulo, são conhecidas duas comunidades remanescentes de quilombo: Caçandoca e Camburi.
Há notícias também da existência de outras duas comunidades quilombolas na região: Cazanga e Poruba.

A região de Ubatuba, até as primeiras décadas do século XIX, contava com pequenas propriedades agrícolas de subsistência, havendo poucos escravos por propriedade, devido ao pequeno poderio financeiro de seus proprietários.

A paisagem fundiária começou a mudar a partir da vinda de colonos estrangeiros para a região, no início do século XIX. Dotados de recursos financeiros, investiram na compra de grandes lotes de terra, visando ao cultivo de produtos agrícolas para exportação, especialmente o café. Trouxeram, para trabalhar nessas terras, um enorme contingente de população de origem africana. Assim, o volume de escravos na região de Ubatuba cresceu enormemente.

Outro fator importante para tal crescimento foi a transformação do porto de Ubatuba num dos principais pontos de recebimento de escravos para as fazendas do Vale do Paraíba e de Minas Gerais. Constituiu-se também em posto de passagem de escravos para outras regiões dentro e fora de São Paulo.

Com o declínio da produção cafeeira, a partir da segunda metade do século XIX, muitas fazendas foram abandonadas, loteadas e vendidas. Porções de terra das fazendas foram ocupadas, ou até mesmo doadas a ex-escravos. Estes passaram a viver com uma relativa autonomia, a partir da produção de pequenas roças e da pesca artesanal.

O litoral norte permaneceu como uma região quase isolada até a construção da rodovia BR 101 (Rio-Santos), na década de 1970. A partir daí, a situação fundiária de Ubatuba alterou-se mais uma vez, então com a entrada de grileiros e especuladores imobiliários movidos pela facilidade de acesso à região que a rodovia propiciou.

Muitas das comunidades quilombolas e caiçaras, que até então viviam com relativa autonomia, foram expulsas de suas posses ou se viram obrigadas a vendê-las, para dar lugar a grandes propriedades, condomínios luxuosos e casas de veraneio.

Ainda na década de 1970, foram criadas duas unidades de conservação ambiental na região: o Parque Nacional da Serra da Bocaina, em 1972, e o Parque Estadual da Serra do Mar/Núcleo Picinguaba, em 1979. Tais parques abarcaram a área de ocupação da comunidade quilombola do Camburi que passou a sofrer restrições a seu modo de vida tradicional.

A luta das comunidades quilombolas do litoral norte pela reconquista de suas terras esbarra numa situação fundiária bastante complexa, envolvendo disputas com grandes empresas imobiliárias.


CAÇANDOCA
A comunidade remanescente de quilombo da Caçandoca está localizada no município de Ubatuba, no litoral norte do Estado de São Paulo.
Os moradores de Caçandoca foram vítimas de um violento processo de expropriação de seu território. Várias foram as ocorrências policiais, as ações judiciais e os recursos administrativos que envolveram a comunidade, grileiros e empresas imobiliárias. O principal conflito deu-se com a empresa Urbanizadora Continental.

Em setembro de 2006, um passo importante foi dado para garantir os direitos territoriais dos quilombolas de Cançandoca. O presidente da República assinou o decreto de desapropriação da propriedade incidente nas terras do quilombo. O objetivo dessa desapropriação foi garantir a titulação daquela área em nome da comunidade. 


ORIGEM DA COMUNIDADE
A história da comunidade iniciou-se em 1858, quando o português José Antunes de Sá comprou a Fazenda Caçandoca.
A fazenda era dividida em três núcleos administrativos que abrigavam uma casa-sede e um engenho: Caçandoca, Saco da Raposa e Saco da Banana. Cada um deles era administrado por um filho de José Antunes de Sá: Isídio, Marcolino e Simphonio. Estes tiveram vários filhos "bastardos" com as mulheres negras que trabalhavam nas terras, além dos legítimos, frutos de casamento com mulheres brancas.

A fazenda desmembrou-se em 1881. Filhos e netos legítimos do proprietário da fazenda herdaram parte das terras, mas nem todos permaneceram nelas.

Uma parte dos ex-escravos mudou-se para outras localidades. Outra permaneceu nas terras da Fazenda Caçandoca, na condição de posseiros, com autorização para administrar seu próprio trabalho.

Os filhos bastardos e os ex-escravos deram origem às principais famílias que hoje formam a comunidade da Caçandoca.

Na fazenda produziam-se café e aguardente de cana-de-açúcar. Depois de seu desmembramento, em 1881, o café foi paulatinamente substituído pela banana e a mandioca. Estes itens eram vendidos pelos moradores da Caçandoca até meados da década de 1970.

É a partir desta data que a comunidade passa a enfrentar sérios conflitos em função da construção da rodovia BR 101, que liga a cidade de Santos (em São Paulo) à capital do Rio de Janeiro. Esta obra teve como conseqüência a expulsão de parte da comunidade de suas terras. 


ATIVIDADES PRODUTIVAS
A economia da comunidade é característica da população caiçara da região, estando baseada na atividade pesqueira e na agricultura familiar, voltada prioritariamente para o autoconsumo.
Até a década de 1970, os principais itens agrícolas produzidos pela comunidade eram a farinha de mandioca, o feijão, o arroz e a cana-de-açúcar (para rapadura e aguardente).

Atualmente, a pesca e a coleta de mariscos além da produção de banana são as principais atividades produtivas.

Muitos quilombolas também trabalham em serviços domésticos nas casas de veraneio do Condomínio do Pulso.

O ecoturismo é uma iniciativa recente da comunidade para a captação de recursos. O ITESP tem apoiado essa iniciativa por meio da capacitação de monitores. 


ORGANIZAÇÃO SOCIAL

Os quilombolas da Caçandoca estão organizados em diversas comunidades, conhecidas como Praia do Pulso, Caçandoca, Caçandoquinha, Bairro Alto, Saco da Raposa, São Lourenço, Saco do Morcego, Saco da Banana e Praia do Simão.
Cada comunidade é formada por uma família extensa, ou seja, os pais, os filhos e filhas e seus maridos e esposas. As famílias compartilham uma área de reserva florestal e administram em conjunto a localização das roças.

As casas das 19 famílias da comunidade não têm luz elétrica nem água encanada. São feitas de pau-a-pique, de tábuas cobertas com calhetão ou de alvenaria.

As festas religiosas, como as do Divino Espírito Santo, de São Benedito (santo negro), de São João, de Santo Antônio, de São Pedro (padroeiro dos pescadores), eram muito comuns na região.

Atualmente, as festas de São Benedito e do Divino estão voltando à comunidade. Esta última movimenta todo o município de Ubatuba, uma vez que sua estrutura consiste em levar a bandeira do Divino em procissão a diversas casas, durante vários dias. Os moradores da Caçandoca fazem parte do percurso e acompanham a procissão da Maranduba até o Simão. 


CAMBURI
A comunidade do Camburi é constituída por 50 famílias e está localizada no município de Ubatuba, litoral norte de São Paulo, já na fronteira com o município de Paraty, no Estado do Rio de Janeiro.
Os quilombolas ocupam a área do Camburi há aproximadamente 150 anos. Ocupando um local extremamente valorizado como ponto turístico, a comunidade sofreu e sofre toda a sorte de pressões para deixar suas terras.









HISTÓRICO DA COMUNIDADE
O Quilombo do Camburi abrigou, no início de sua ocupação, vários núcleos de escravos fugidos de fazendas de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Segundo relatos dos moradores da comunidade, um grupo de negros, liderado por uma escrava chamada Josefa, que vieram fugidos de fazendas da região de Paraty, no Rio de Janeiro, teria sido um dos primeiros a ocupar a área. Muitos moradores se referem à escrava Josefa como uma "parenta" distante e o lugar onde ela teria se refugiado até hoje se mantém na comunidade como um marco histórico: a Toca da Josefa.

O levantamento de documentos históricos realizado por pesquisadores do ITESP mostrou ter havido, também nessa área, uma fazenda denominada Cambory.

A Fazenda Cambory não fugia ao padrão das outras fazendas do litoral norte dessa época (séculos XVIII e XIX): grandes propriedades que tiveram, num primeiro momento, engenhos de cana-de-açúcar e posteriormente produziram café para exportação com mão-de-obra escrava. E, a partir da metade do século XIX, entraram em decadência, tendo suas terras divididas e doadas, vendidas ou mesmo abandonadas.

Ao que tudo indica, a Fazenda Cambory foi ocupada, por compra e doação, por núcleos de escravos que nela trabalhavam. Este núcleo de escravos agregava-se a outros núcleos, vindos de outras regiões.

O quilombo permaneceu relativamente isolado até a década de 1970 quando uma série de acontecimentos ameaçou sua permanência em suas terras e trouxe mudanças para seu modo de vida.

Por um lado, houve a construção da BR 101 que atraiu para a região grileiros, especuladores e empresas que usaram de todo tipo de violência e subterfúgios para expulsar as comunidades tradicionais da região, como as dos Quilombos do Camburi e da Caçandoca.

A comunidade foi alvo de diversos processos de grilagem e compras ilegais de posse, derivados da especulação imobiliária. No início da década de 1970, 80% do território do Quilombo do Camburi estava sob o domínio e posse de dois grandes compradores de terra, Francisco Munhoz e José Bento de Carvalho, que expulsaram os antigos moradores. Estes se deslocaram para as áreas mais íngremes, de mais difícil acesso, ou se mudaram para outras cidades do litoral paulista, como Santos.

Por outro lado, ocorreu a criação do Parque Nacional da Serra da Bocaina (em 1972) e do Parque Estadual da Serra do Mar/Núcleo Picinguaba (em 1977) nas terras da comunidade, que trouxeram uma série de restrições para a prática da agricultura e do extrativismo. 


ATIVIDADES PRODUTIVAS
Até a década de 1960, a população do Camburi vivia de roças de subsistência, da caça, da coleta e da pesca. Alguns produtos excedentes, principalmente o pescado, eram vendidos ou trocados nas cidades de Ubatuba e Paraty por produtos manufaturados.
Com a criação do Parque Estadual da Serra do Mar/Núcleo Picinguaba e do Parque Nacional da Serra da Bocaina, na década de 1970, proibiu-se o extrativismo vegetal.

As imposições legais de corte de madeira trouxeram danos graves para a comunidade. Os pescadores não puderam mais tirar a madeira para construir suas canoas, dificultando as atividades da pesca. Devido às restrições, o conhecimento e as técnicas de construção das canoas acabaram se perdendo. Como resultado, atualmente a maior parte dos pescadores trabalha em barcos de terceiros.

A atividade agrícola diminuiu também consideravelmente, pois, em função dos parques, não foi mais permitida a prática tradicional do "pousio". Esta técnica consiste em abrir uma clareira em floresta virgem, cultivar a terra durante poucos anos e depois deixa-la em repouso, por um longo período, para que se reconstitua.

Com as restrições ambientais impostas pelos parques, as alternativas de subsistência e de geração de renda dos moradores do Camburi ficaram muito limitadas e insuficientes para garantir a adequada manutenção da população.

Atualmente, a pesca é a atividade mais importante para a obtenção de alimentos e também garante empregos no inverno, quando os pescadores vão trabalhar em grandes embarcações de fora.

O artesanato é praticado por alguns membros da comunidade, que encontram dificuldades para comercializá-lo.

Outra alternativa adotada pelos moradores foi trabalhar fora da comunidade, geralmente como caseiros nas casas de veraneio da região ou em obras da construção civil.

Outra saída, adotada a partir de 2002, foi o investimento no turismo ecológico. O turismo tal como vinha sendo praticado até então era desorganizado e trazia malefícios para a população, ao poluir as cachoeiras e rios, além de espalhar o lixo pela praia.




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Os levantamentos mais recentes realizados por pesquisadores e militantes de organizações não governamentais indicam a existência de 300 a 500 comunidades quilombolas no Estado da Bahia. O Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades de Quilombos do governo federal registrava em outubro de 2006 a existência de 159 comunidades naquele estado.

Na Bahia, até outubro de 2006, quatro comunidades contavam com suas terras tituladas (ou ao menos parcialmente tituladas) pelo governo federal ou estadual: Barra, Bananal e Riacho das Pedras; Parateca e Pau D'Arco; Rio das Rãs; Mangal e Barro Vermelho.
A história de grande parte dos quilombos na Bahia é marcada por disputas e conflitos com os grandes proprietários e grileiros. Conheça um pouco mais da trajetória de luta de algumas dessas comunidades:

RIO DAS RÃS: UM EXEMPLO DE LUTA E CONQUISTA Situada no município de Bom Jesus da Lapa, entre o rio São Francisco e o rio das Rãs, a comunidade remanescente de quilombo Rio das Rãs teve seu território titulado pela Fundação Cultural Palmares no ano de 2000 com 272 mil hectares.
As cerca de 300 famílias de Rio das Rãs distribuem-se por diversos pontos de seu território nas localidades conhecidas como Brasileira, Capão do Cedro, Enxu (ou Exu), Riacho Seco, Mucambo, Pau Preto, Retiro, Corta Pé e Rio das Rãs.

A região do médio rio São Francisco onde se encontra essa comunidade passou a ser ocupada a partir do século XVI. Entre os séculos XVII e XVIII, quando se encontrava na rota canavieira nordestina e mineradora, a região experimentou um período de grande prosperidade, principalmente com a criação de gado. Depois, porém, vivenciou quase cem anos de dificuldades em função da decadência da atividade pecuária. Nesse período permaneceram na região quase que exclusivamente negros e índios aquilombados.

Com a instituição da Lei de Terras em 1850, grileiros, posseiros e supostos donos de terras buscaram obter ou regularizar títulos de propriedade sem levar em conta os direitos da população que historicamente ocupava a região. Foi nesse processo que, no final do século XIX, o coronel Deoclesiano Teixeira estabeleceu o controle sobre as terras dos quilombolas de Rio das Rãs.

Segundo relatam os moradores mais antigos da comunidade, seus antepassados entraram em acordo com o coronel e, na prática, os comunitários tornaram-se agregados, trabalhando para ele como vaquejadores. Esse arranjo só viria a se modificar na segunda metade do século seguinte.

Passado quase um século de relativa calmaria na região, a comunidade se defronta com novas ameaças. No início da década de 1970, novos conflitos se iniciaram na região. A violência foi intensa e muitos quilombolas foram expulsos, além de algumas localidades acabarem se extinguindo.   No início da década de 1980, a compra dessas terras pelo Grupo Bial-Bonfim Indústria Algodoeira agravou ainda mais essa situação de conflito.

Nessa luta, os quilombolas contaram com diversos aliados como o Ministério Público Federal, o Movimento Negro Unificado e a Comissão Pastoral da Terra. A comunidade saiu vitoriosa e conseguiu em 2000 o título sua terra.

Os quilombolas de Rio das Rãs tornaram-se exemplo de luta e estímulo para outras comunidades quilombolas da Bahia e do Brasil por sua resistência e suas conquistas.
  

A CONQUISTA DO TÍTULO A década de 1970 foi marcada pelas primeiras tentativas de expulsão dos quilombolas de suas terras, perpetradas pelos herdeiros do coronel Deoclesiano, que detinham a propriedade da Fazenda Rio das Rãs sobreposta ao território tradicional da comunidade.
Primeiro veio a proibição de abertura de novas roças. Depois a proibição da atividade pesqueira, a retirada das cercas que protegiam os roçados dos quilombolas e, por fim, a destruição de algumas casas e de uma igreja.  

Em 1978, com a intenção de reunir numa exígua extensão de terra todos os quilombolas que se encontravam distribuídos em diversas localidades, Celso Teixeira (um dos herdeiros da família Teixeira) realizou uma suposta doação de 4 mil hectares da Fazenda Rio das Rãs. Além de ter sido uma "doação" ilegal - pois aquela porção de terra era atribuída judicialmente a seu primo Fernando Teixeira e não a Celso -, o terreno se resumia apenas à localidade de Brasileira.

Em 1982, a família Teixeira vendeu ao Grupo Bial-Bonfim Indústria Algodoeira parte das terras da Fazenda Rio das Rãs. O grupo, o terceiro maior produtor de algodão do país, era presidido por Carlos Newton Vasconcelos Bonfim. Começou, a partir daí, o período de maior violência contra a comunidade. O conflito que se estendeu até fins da década de 1990 quase extinguiu a comunidade de Rio das Rãs.

Alguns dos abusos praticados por Carlos Bonfim, a partir de 1985, foram: a destruição de casas e roças dos comunitários (só em Rio das Rãs e Juá, no ano de 1985, foram destruídas 127 residências); o envenenamento do Rio das Rãs na altura da localidade de Aribá; e a destruição de matas nativas em área ocupada pelos quilombolas.

Em 1988, houve uma nova tentativa de concentração dos quilombolas na comunidade de Brasileira. Nessa nova tentativa, Carlos Bonfim evocou a "doação" da década de 1970 para forçar que todos os quilombolas se dirigissem à localidade e se concentrassem lá. Em 1989, no entanto, os comunitários conseguiram retornar para as comunidades de onde haviam sido expulsos.

Como resultado desse processo de violência, muitas localidades existentes até o final da década de 1980 foram abandonadas, tais como Manga, Maguinho, Juá, Aribá, Cedro, Baixa do Mari, Lagoa do Pajeú, Caldeirão e Maiadarta.

A sobrevivência da Comunidade de Rio das Rãs só foi possível graças à resistência dos quilombolas. A união entre os próprios comunitários foi fundamental na medida em que aqueles poucos que conseguiam manter o acesso à terra auxiliavam os demais.

Nessa luta, os quilombolas de Rio das Rãs contaram com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bom Jesus da Lapa, do Movimento Negro Unificado da Bahia, da Comissão Pastoral da Terra, da Igreja Católica e do Ministério Público Federal.

No início da década de 1990, iniciou-se um processo de reversão desse quadro de injustiça que culminou com a desapropriação da Fazenda Rio das Rãs e o reconhecimento dos direitos dos quilombolas.

O primeiro passo na esfera judicial foi dado pelo Ministério Público Federal que ingressou com duas ações em 1993. A primeira delas buscou garantir o direito da comunidade criar seus animais e realizar suas atividades agrícolas, práticas que estavam ameaçadas pela atuação da Bial Agropecuária. Já na decisão liminar, o juiz acatou o pedido do Ministério Público.

Na outra ação, o Ministério Público Federal solicitou que os integrantes da comunidade fossem declarados remanescentes de quilombos para os fins do art. 68 da ADCT da Constituição Federal; que a União Federal fosse condenada a adotar medidas para delimitar e demarcar a área ocupada pela comunidade e emitir o título hábil para registro no Cartório Imobiliário. Já em relação à empresa privada, pedia que o juiz ordenasse o fim das práticas violentas contra os quilombolas. Em primeira instância (em julho de 1999) a União foi condenada a titular a terra e, mesmo tendo recorrido da decisão, o fez em 2000.

Nos anos de 1995 e 1997, o Incra passou a atuar no caso e foram expedidos decretos presidenciais que declararam de interesse social a Fazenda Rio das Rãs. Foram emitidos dois decretos em razão de divergências que envolveram a Fundação Cultural Palmares sobre a área efetivamente ocupada pelos quilombolas.

Sanadas as divergências no ano seguinte ao último decreto (1998) foi firmado entre a Associação Agropastoril das Comunidades de Rio das Rãs e a Superintendência do Incra da Bahia um contrato de Concessão de Direito Real de Uso Coletivo de Propriedade. Com a concessão, foram imitidas na posse cerca de 400 famílias identificadas como descendentes dos antigos moradores dos quilombos de Rio das Rãs.

Posteriormente, no ano de 2000, a Fundação Cultural Palmares (na época o órgão do governo federal responsável pela titulação das terras de quilombo) outorgou o título de propriedade à comunidade.



AS PRÁTICAS RELIGIOSAS

A religiosidade dos habitantes de Rio das Rãs se expressa de várias formas. Ao lado dos cultos evangélicos, em especial da igreja da Assembléia de Deus, os cultos afro-brasileiros têm uma grande importância para a comunidade.
A linha adotada pelos mentores espirituais é mais alinhada à Jurema, que em outras regiões do Brasil recebe denominações distintas como pajelança (norte), macumba (sul e sudeste) e catimbó (nordeste).

Em Rio das Rãs se cultua os espíritos deste lado do mundo, ou seja, do Novo Mundo, como o caboclo, o preto velho, as guias e os espíritos que portam histórias concretas. Durante os encontros, os cantos e as falas são em língua portuguesa.

Um dos principais mentores espirituais de Rio das Rãs é Andrelino, que se tornou uma referência nos processos de cura espiritual tanto para os comunitários quanto para habitantes das regiões próximas e de localidades mais distantes.

Os seguidores do culto da Jurema a vêem como uma forma de cura, proporcionada por um grupo de entidades particulares ou por uma pessoa com poderes especiais. Defendem, ainda, que ela se diferencia do candomblé na medida em que não existem tambores durante os cultos.

Pode-se dizer que o trabalho desenvolvido por Andrelino é uma mescla de catolicismo popular, espiritismo e cultos africanos. No processo de cura, por exemplo, são evocados os médiuns do espiritismo, como dr. Bezerra de Menezes, uma importante referência dentro do espiritismo brasileiro.

O local dos cultos e de cura é uma igreja erguida ao lado da moradia de Andrelino, no núcleo central da localidade de Enxu. A igreja se configura como um misto de templo e de hospital e se destaca pelo tamanho. O local, todo de alvenaria, é uma casa em que existem oito quartos de cura onde, além de Andrelino, outros dezenove médiuns atendem o público.

No altar existente na sala principal da casa (igreja) estão dispostas as mais diferentes figuras e imagens: caboclos índios, caboclos negros, pretos-velhos, terços, pombas brancas, garrafa com bebida de jurema, flores de plástico, Iemanjá, Nossa Senhora Aparecida etc.

A figura central da Jurema de Rio das Rãs é o caboclo Manoel Guerreiro da Jurema. Incorporada por Andrelino, essa entidade que preside os trabalhos e controla os outros guias é um caboclo do mato. Nele se funde também a figura do Rei Nagô.

Os estudiosos definem a Jurema de Rio das Rãs como uma reunião de vários elementos tradicionais da religiosidade brasileira. Identificam-se vários estilos: candomblé de caboclo baiano; jarê da Chapada Diamantina; o estilo musical dos cantos benditos, incelenças, toadas, reisado e congada; a pemba (culto afro-brasileiro praticamente extinto, mas ainda existente em algumas localidades mineiras e capixabas).

Além da questão espiritual, Andrelino cumpre uma importante função dentro da comunidade. Ainda que não esteja entre os mais velhos da comunidade, sua fala e sua liderança são fundamentais para a comunidade. A organização do trabalho, a abertura de roças, a distribuição dos produtos, a mediação dos conflitos e o estímulo à resistência quilombola são ações que necessariamente passam por Andrelino.

MANGAL E BARRO VERMELHO
As comunidades remanescentes de quilombo Mangal e Barro Vermelho estão localizadas no município de Sítio do Mato, às margens do rio São Francisco na região conhecida como médio São Francisco.

As terras das comunidades já estão tituladas. Inicialmente, em janeiro de 1999, foi titulada uma área de 153 hectares pelo Instituto de Terras da Bahia (Interba) em conjunto com a Fundação Cultural Palmares. Foi a primeira comunidade baiana a ser titulada pelo órgão Estadual. Já em julho de 2000, outros 7.615 hectares foram titulados pela Fundação Cultural Palmares.

Antes da conquista da titulação, porém, os quilombolas de Mangal e Barro Vermelho experimentaram a violência e o conflito. E, como outras comunidades quilombolas da região, resistiram.
  
A ORIGEM E A RESISTÊNCIA A partir do século XVI, a cultura canavieira e a busca por minerais preciosos fizeram da região do médio São Francisco um local de intenso trânsito tanto para o norte e nordeste do país quanto para as Minas Gerais.
Naquele cenário, coube à região o importante papel da pecuária que, durante mais de 200 anos foi a sua atividade principal. A história de Mangal e Barro Vermelho está inserida dentro desse contexto. A própria comunidade reconhece sua ascendência nos antigos escravos das fazendas de gado.   

A memória da comunidade dá conta da existência de duas grandes fazendas (Tabuleiro e Mangal) na região até as primeiras décadas do século XIX. A partir dessa época, as fazendas foram sendo divididas por herança e venda.  

Com a instituição da Lei de Terras em 1850 iniciou-se o primeiro processo de expulsão violenta de população negra residente na região. As conseqüências só não foram mais graves devido a um fato curioso relatado pelos comunitários mais idosos. Na Fazenda Mangal, o proprietário era conhecido como capitão João e tinha uma filha adotiva, chamada Gertrudes. Em dado momento da história, Gertrudes teria se apaixonado por um vaqueiro da região. Seu pai, desgostoso com o relacionamento, mudou-se para outra propriedade deixando sua filha em Mangal. Algum tempo depois, Gertrudes achou por bem doar grande parte da Fazenda Mangal a Nossa Senhora do Rosário, padroeira do lugar. Na memória da comunidade a doação teria acontecido após a abolição.

Com a doação, a fazenda ficou relativamente desvinculada dos conflitos. A comunidade já residente ficou um pouco resguardada naquela porção de terra e pôde inclusive receber outras pessoas expulsas das localidades próximas. Não faltaram, porém, algumas tentativas de fazendeiros e grileiros de se apropriar da área.

A partir de 1970, os incentivos econômicos proporcionados pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) motivaram uma nova tentativa de expulsão dos quilombolas de suas terras. O símbolo maior daquele tempo foi o cercamento das terras por grileiros ou fazendeiros que pretendiam delimitar ou expandir seus domínios.

Na década de 1990, amparados pelo artigo 68 da ADCT da Constituição Federal e pelo artigo 51 da Constituição do Estado da Bahia, os quilombolas passaram a reivindicar a titulação de suas terras. Reivindicação que foi atendida com a entrega dos títulos outorgados em 1999 e 2000.

ATIVIDADES ECONÔMICAS A agricultura de subsistência, com destaque para as culturas de feijão, mandioca e milho, é a principal atividade dos quilombolas de Mangal e Barro Vermelho. Desenvolvida com maior intensidade nos meses de dezembro a março, a agricultura é realizada em grande parte na roça comunitária. Nesse espaço, com regras de uso definidas, os membros da comunidade que não dispõem de outras fontes de renda têm o direito de plantar. Além da roça comunitária, alguns também plantam em pequenas porções de terra junto à própria residência.
A criação de animais, ainda que diminuta, também tem sua importância para as comunidades. Do rebanho caprino tira-se o leite e a força motriz. Já as galinhas e os porcos servem, muitas vezes, como alimento nas diversas festas organizadas pela comunidade.

Historicamente a pesca, realizada no rio e nas lagoas formadas na época de seca, sempre foi outra atividade relevante para a comunidade. A partir da década de 1970, com o agravamento das restrições impostas pelos fazendeiros, a pesca teve uma retração grande, mas ainda é praticada pelos comunitários.

A importância da pesca pode ser revelada pela variedade de métodos de pesca, alguns deles com nomes criados pela própria comunidade: anzol, tarrafa, "trio" (fios de arame farpado em que são colocadas iscas), "mergo" (arpão fincado na ponta de uma vara) e arco-e-flecha. De todos os métodos de pesca, somente o arco-e-flecha não é mais utilizado, sendo lembrado apenas como método dos antepassados.  

Outra fonte de renda comum na região era a venda de dias de trabalho dos comunitários para fazendeiros das localidades próximas. Mas esse tipo de contratação diminuiu consideravelmente em razão dos conflitos e da decadência da região, que levou muitos fazendeiros a deixar suas terras.

OS SANTOS DEVOTADOS E A MARUJADA
O calendário de festejos de Mangal e Barro Vermelho é repleto de homenagens e agradecimentos a santos da Igreja católica. Em janeiro, são realizadas as festas de Reis e de São Sebastião. Em junho, a festa de Santo Antônio. Em outubro, homenageia-se Nossa Senhora do Rosário e em dezembro Nossa Senhora da Conceição. São Gonçalo é outro santo devotado pela comunidade e as homenagens que lhe são rendidas acontecem várias vezes ao ano.
As festas em geral são acompanhadas da queima de fogos, de rodadas de cachaça e refrigerante, samba de roda e ceia. Além das datas tradicionais, as homenagens aos santos podem também ser realizadas em outras ocasiões, quando, por exemplo, um comunitário necessita pagar uma promessa ou se pretende homenagear uma pessoa falecida.

São os festejos a Nossa Senhora do Rosário, padroeira da região, e a Nossa Senhora da Conceição que mais movimentam a comunidade e nos quais se realiza a Marujada, ritual praticado exclusivamente por homens e que inclui cantos e encenações.

Os componentes da Marujada usam uma vestimenta específica composta por uma tradicional farda branca e uma faixa transversal que desce do ombro direito em direção ao lado esquerdo do corpo. A coloração da faixa é outro signo importante e varia conforme o motivo do festejo. Em geral utiliza-se a vermelha, no entanto, quando a festa tem como homenageado uma pessoa já falecida, usa-se a faixa azul. Finalizando a vestimenta, os marujos levam em sua cabeça um chapéu colorido feito com papel crepe.

A festa inicia-se no alvorecer do dia, em um porto localizado nos limites entre Mangal e Barro Vermelho. Os marujos postam-se de pé em canoas e, navegando aos pares, chegam até o porto de Mangal. Durante o trajeto, a população local acompanha das margens do rio a passagem da Marujada e a saúda com fogos de artifício. Chegando ao porto de Mangal, os marujos descem de suas canoas e se dirigem à igreja, marchando e saudando a padroeira e os santos devotados.

A Marujada tem como figuras centrais: o mestre, o contra-mestre, o "ração" e o "careta". Ao mestre cabe entoar cantos e conduzir cerca de 30 homens (denominados pelotão) que o acompanham com seus pandeiros, vozes e marcha ritmada. No intervalo entre um canto e outro, o mestre convoca o "ração".

Fechando o pelotão que acompanha o mestre, o "ração" é um menino que atende rapidamente ao chamado e se dirige para a frente do grupo. Em seguida, bate continência ao mestre e enuncia: "Pronto patrão!". A partir daí, o mestre passa a questionar o "ração" sobre a disponibilidade da tropa para seguir. A cada resposta o pelotão realiza uma batida com os pés e uma pancada seca dos pandeiros.

Durante a passagem da Marujada, o contra-mestre tem a função de controlar a evolução da tropa, corrigindo os descompassos e ritmos irregulares. Já o quarto personagem central é o "careta", que, com vestimenta especial, portando chibata e adornado com uma máscara no rosto, açoita aqueles que o provocam ou que ele deseja assustar.


SÃO FRANCISCO DO PARAGUAÇU 

A comunidade São Francisco do Paraguaçu está localizada no Recôncavo Baiano, mais precisamente no Vale do Iguape, juntamente com mais de uma dezena de comunidades remanescentes de quilombo.
As comunidades quilombolas da região se articulam no Conselho Quilombola do Vale e Bacia do Iguape para lutar pelo direito à terra e ter acesso aos serviços públicos. O conselho, atualmente integrado por 11 comunidades, conta com a parceria de organizações não governamentais tais como a Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Salvador, a Comissão Pastoral dos Pescadores, a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia.

Como resultado dessa luta, os quilombolas conseguiram que o Incra desse início ao processo de titulação de diversos territórios quilombolas da região. Em outubro de 2006, as terras das comunidades Dendê, Engenho da Praia, Engenho da Ponte, Calemba, Caonge, Caimbongo Velho, Imbiriá, Calolé e Tombo eram alvo de processo de regularização pelo Incra.

No entanto, a possibilidade de regularização dos territórios quilombolas tem trazido para região alguns conflitos com fazendeiros. Em São Francisco do Paraguaçu, a resistência da elite fazendeira local, desrespeitando o direito das comunidades tradicionais, vem se traduzindo em investidas violentas contra os comunitários.


O CONFLITO EM SÃO FRANCISCO DO PARAGUAÇU 
 A comunidade remanescente de quilombo de São Francisco do Paraguaçu está localizada no município de Cachoeira. Na comunidade, cerca de 300 famílias vivem da agricultura de subsistência, da pesca, da coleta de marisco e do extrativismo da piaçava.
Além da participação no Conselho Quilombola do Vale e Bacia do Iguape, os comunitários estão organizados na Associação dos Remanescentes do Quilombo São Francisco do Paraguaçu - Boqueirão.

A partir de 2005, o reconhecimento da condição quilombola da comunidade pelo governo federal acirrou o conflito com os fazendeiros da região. A comunidade foi alvo de diversas formas de violência: destruição de roças, de barracos e da sede da associação; invasões de residência pela polícia; restrições ao trânsito dos comunitários; ameaça de morte de um adolescente quilombola e perseguições armadas. Segundo denúncia dos quilombolas, em vários desses atos os fazendeiros contaram com a colaboração de agentes públicos e policiais militares.

O conflito também já se instalou no campo judicial. Uma das famílias que disputa a terra com os quilombolas ingressou com ação de reintegração de posse na comarca de Cachoeira, respaldada por um título de propriedade datado de 1904. A Justiça Estadual acatou o pedido do fazendeiro e concedeu a liminar ordenando que os quilombolas desocupassem suas terras tradicionais. A polícia militar chegou a realizar algumas ações visando cumprir a ordem judicial.

O Ministério Público Federal e a Fundação Cultural Palmares saíram em defesa dos quilombolas e suscitaram conflito de competência, ou seja, consideraram que a matéria não poderia ser julgada pela Justiça Estadual. Assim, em maio de 2006, o processo foi remetido para a Justiça Federal.

Com a mudança do juízo competente, os quilombolas tinham a esperança de que houvesse um julgamento mais isento e em acordo com as disposições constitucionais. No entanto, o juiz federal manteve a decisão liminar da Justiça Estadual mesmo sem realizar audiência de justificação de posse ou inspeção judicial. A medida liminar só fez agravar e tornar mais freqüentes as investidas contra a comunidade que colocam a vida e a subsistência dos quilombolas em risco real e iminente.

Receosa de que os ataques tragam conseqüências ainda mais danosas, a comunidade vem reiteradamente solicitando o apoio de organizações e pessoas afeitas à luta quilombola. Nessa árdua luta contam com o auxílio de organizações como o Conselho Pastoral dos Pescadores, a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais e a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Salvador.


Habitada originalmente por índios Maracás, a região do Vale do Iguape passou por transformações nas décadas seguintes à chegada dos portugueses ao Brasil. A expulsão dos índios foi o primeiro passo dado pelos colonizadores. A região era propícia não só para a instalação e a expansão das fronteiras agrícolas, mas servia também como importante via de acesso, pelo rio Paraguaçu, para o interior do Brasil.

Na primeira metade do século XVII a região experimentou um período de maior prosperidade das culturas canavieira e fumagueira. Já a segunda metade daquele século foi marcada pelo declínio da produção de cana-de-açúcar.

No auge da atividade agrícola, foram instalados nas grandes fazendas inúmeros engenhos de cana-de-açúcar. O cultivo e o beneficiamento da cana dependiam do uso de mão-de-obra escrava. Fugas e rebeliões de escravos eram comuns e contribuíram para a formação dos primeiros quilombos da região.

A prosperidade da região no século XVII favoreceu a concentração populacional e a constituição da Vila de Nossa Senhora do Rosário do Porto de Cachoeira. Em 1837, a Vila foi elevada à condição de município, denominado simplesmente Cachoeira. O declínio da atividade rural não impediu que, no final do século XVII e início do XVIII, a Vila passasse por seu período de maior desenvolvimento, com a construção de um conjunto arquitetônico ainda preservado e hoje considerado Monumento Nacional pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico e Nacional.

Já na área rural, a retração da cultura canavieira favoreceu o aumento da população aquilombada que passou a se concentrar principalmente nas proximidades dos engenhos que foram abandonados.

As principais atividades dos quilombolas eram a agricultura de subsistência, a pequena criação de gado, a pesca, a coleta de marisco e o extrativismo da piaçava e do dendê.


JATOBÁ 

A Comunidade de Jatobá, localizada às margens do rio São Francisco no município de Muquém de São Francisco, é formada por cerca de 70 famílias que ocupam um território de 14 mil hectares.

Vivendo à beira do rio São Francisco, o modo de vida da população de Jatobá é influenciado pelos períodos de cheia e de seca do rio. O movimento das águas é importante não só para a atividade pesqueira como também para a agricultura.

Os quilombolas praticam a agricultura de subsistência, sendo a mandioca, o milho e o feijão os principais itens cultivados. Vivem ainda da criação bovina e caprina e da pesca (do curimatá, do surubim e da piranha).

Nas últimas décadas, a ação do fazendeiro Antonio Limoeiro tem gerado conflitos e maiores restrições de acesso da comunidade à terra que ocupam há mais de cem anos. O conflito teve início em 1984 quando Antonio Limoeiro chegou à região. Dono de uma empresa de terraplenagem, desde o princípio o fazendeiro avisou que era contrário às roças dos quilombolas.

A partir de 1994 o fazendeiro e seus prepostos começaram a adotar medidas violentas. Naquele ano, um morador da comunidade teve a cerca de sua casa derrubada e lhe foi proibido cultivar sua roça.

Depois desse fato vieram outros. Em 1998, um comunitário teve sua casa derrubada e uma barraca de lona destruída pelo gerente da fazenda e seus capangas. Durante esse ato, ainda ameaçou com um cavalo o morador. Pouco tempo depois, roças ao redor das casas de outros quilombolas foram destruídas assim como a mata na beira do rio. Em 1999, durante nova ofensiva do gerente e dos capangas de Antonio Limoeiro, tiros foram disparados e ameaças de morte foram feitas com o intuito de intimidar os comunitários.

Em 1999, os comunitários formaram a Associação dos Trabalhadores Rurais da Fazenda Jatobá. Alguns órgãos foram, então, oficiados pela associação para que tomassem ciência do conflito bem como das ilegalidades que estavam sendo praticadas.

Nos anos de 2000 e 2001, os conflitos se agravaram, restringindo ainda mais as possibilidades dos quilombolas continuarem praticando a agricultura, a criação de animais e a pesca.

Em 2004, a Fundação Cultural Palmares reconheceu a comunidade de Jatobá como remanescente de quilombo.

No ano de 2006, a Superintendência do Incra da Bahia abriu um processo para titulação das terras em nome da comunidade quilombola e iniciou a elaboração do relatório técnico de identificação e delimitação. Abriu-se, assim, uma nova esperança para a resolução dos conflitos fundiários envolvendo a Comunidade de Jatobá.


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 Para saber mais acesse os seguintes links:

http://www.quilombodospalmares.com.br/index.php?sec=quilombo_palmares_organizacao

http://www.koinonia.org.br/oq/oquilombo.asp

http://www.mds.gov.br/segurancaalimentar/povosecomunidadestradicionais/quilombolas

http://www.palmares.gov.br/tag/comunidades-quilombolas/

http://www.quilombosdoribeira.org.br/






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