Com
esta peça de teatro Pedro Calderon de La Barca (1600 – 1681), assentou de vez o
movimento Barroco no teatro espanhol. Mesmo em uma sociedade com valores
enraizados nas ideias cristãs, os presságios no século XVII eram vistos como
coisas muito sérias. A temática da peça gira em torno disto. No texto, o rei
Basílio resolve prender seu filho por toda a vida pelos perigos que
representava (mesmo não tendo nascido ainda, já o tinha como um vilão a ser
combatido). A ideia do rei Basílio surgiu depois de alguns pesadelos de sua mulher
durante a gravidez. E, além de tudo, a criança veio ao mundo num dia de eclipse
(também visto pela sociedade da época como um evento de mau agouro). A sorte do
príncipe Segismundo estava lançada. A peça começa justamente com Segismundo sem
saber que é herdeiro do trono da Polônia, em um castelo isolado do mundo. Lá,
apenas um criado o educa, fala com ele e atende a suas necessidades.
A
trama acontece quando o rei, sem saber afinal se os presságios faziam ou não
sentido, e com pesar, decide dar uma chance ao herdeiro, já adulto. Vai
sedá-lo, tirá-lo da prisão e deixar que governe por apenas um dia. Se for bom
governante, ganha o trono. Se for o tirano que se imaginava, será sedado de
novo e devolvido ao cárcere. E tentarão convencê-lo de que tudo aquilo, seu dia
de rei, não passou de um sonho.
A
ideia de que a vida é sonho é enunciada pelo próprio protagonista, no trecho
mais famoso da peça.
Eu sonho que estou aqui
de correntes carregado
e sonhei que em outro estado
mais lisonjeiro me vi.
Que é a vida? Um frenesi.
Que é a vida? Uma ilusão,
uma sombra, uma ficção;
o maior bem é tristonho,
porque toda a vida é sonho
e os sonhos, sonhos são.
A
ideia é que só a vida fora do mundo (Deus, o Paraíso, o mundo das ideias) é
verdadeira. O mundo que vemos é uma ilusão. Estamos aqui sem ver o que importa.
E
não é só o ideário religioso que está retratado ali. Calderón de La Barca
também representa as disputas políticas da época. Estamos antes da Revolução
Francesa. E o que está no ar ainda é o regime Absolutista.
Contam de um sábio, que um dia
Tão pobre e mísero estava
Que apenas se sustentava
Com as ervas que colhia.
“Haverá alguém”, se dizia,
“ mais triste e vil do que sou?”
E quando o rosto voltou
Achou a resposta, vendo
Outro sábio recolhendo
As folhas que ele jogou
Sonha o rei que é rei, e deve
com este erro viver
mandando,
só dispondo e governando;
e este aplauso, que por breve
período recebe, inscreve
no vento, e em cinzas a morte
o converte, triste sorte!
Há quem pretenda reinar
Vendo que há de despertar
em pleno sono da morte?
Sonha o rico em sua riqueza,
que mais ganhos lhe oferece;
sonha o pobre que padece
sua miséria e sua pobreza;
sonha o que terá grandeza,
sonha o que afana e pretende,
sonha o que agrava e ofende,
e no mundo, em conclusão,
todos sonham o que são,
embora ninguém o entende.
Eu sonho que estou aqui
das prisões encarregado,
e sonhei que em outro estado
mais lisonjeiro me vi.
Que é a vida? Um frenesi.
Que é a vida? Uma ilusão,
Uma sombra, uma ficção,
e é pequeno o maior bem:
que a vida é sonho também,
e os sonhos, sonhos são.
Cuentan de un sábio, que um día
tan pobre y mísero estaba,
que sólo se sustentaba
de unas yerbas que cogía.
¿Habrá outro, entre sí decía,
más pobre y truste que yo?
Y cuando el rostro volvió,
halló la respuesta, viendo
que iba outro sábio cogiendo
las hojas que él arrojo
Sueña el rey qye es rey, y vive
con este engano mandando,
disponiendo y governando;
y este aplauso, que recibe
prestado, em el viento escribe,
y em cenizas este aplauso, que recibe
prestado, en el viento escribe,
y em cenizas le convierte
la muerte, ¡desdicha flerte!
¿Que hay quien intente reinar,
viendo que ha de despertar
em el sueño de la muerte?
Sueña el rico em su riqueza,
que más cuidados le oferece;
sueña el pobre que padece
su miséria y su pobreza;
sueña el que a medrar empieza,
sueña el que afana y pretende,
sueña el que agravia y ofende,
y en el mundo, em conclusión,
todos sueñan lo que son,
aunque ninguno lo entende.
Yo sueño que estoy aqui
destas prisiones cargado,
y soñé que em outro estado
más lisonjeiro me vi.
¿Qué es la vida? Um frenesi.
¿Qué es la vida? Uma ilusión,
una sombra, uma ficción,
y el mayor bien es pequeno:
que toda la vida es sueño,
y los sueños, sueños son.
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